ANA BEATRIZ GARCIA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
O Judiciário pode instaurar que o passaporte de devedor que se mudou para outro país seja apreendido e retido, decidiu o STJ (Superior Tribunal de Justiça).
O empresário vendeu sua lar e a maior secção de seus bens, além de fechar sua empresa de consultoria em engenharia social, e mudou-se para os Estados Unidos com a família um dia antes da data do trânsito em julgado da ação que o condenava por uma dívida. Em seguida o trânsito em julgado não é mais provável apresentar recursos para discutir se há a dívida ou não.
Ele saiu do país em 2023 com a esposa e os três filhos em direção a Fort Lauderdale, no estado da Flórida.
A mandamento de apreender e reter o passaporte foi dada pela 2ª Vara Cível da Comarca de Parnaíba, no Piauí, uma vez que coerção indireta ao pagamento de dívida que estava em processo de realização.
O STF (Supremo Tribunal Federalista) e o próprio STJ já haviam deliberado, em outras ocasiões, que a consumição de passaporte para executar uma sentença judicial é legítima.
No caso em questão, a mandamento foi feita depois diversas alternativas para cobrar o verba, uma vez que tentativa de bloqueio de contas no nome do devedor e de penhora e avaliação de cinco veículos de sua propriedade, sendo um deles de luxo. No entanto, nenhuma das contas em seu nome tinha saldo positivo, e nenhum dos veículos foi encontrado.
Também foram executadas as quotas de participação societária da sua empresa.
A dívida surgiu quando o devedor e o credor formaram uma sociedade para comprar um terreno onde o devedor construiria uma lar, que seria posteriormente vendida. Ambos dividiriam os lucros.
Porquê o negócio não foi concluído, o credor procurou a Justiça, buscando o ressarcimento. A dívida originalmente era de R$ 62.500, mas hoje já totaliza R$ 93.556,99 com correção.
A decisão pela constitucionalidade da medida no STF ocorreu em fevereiro de 2023, na ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5941. Nela, o ministro relator Luis Fux afirmou que a questão não trata somente da relação entre credor e devedor, mas da urgência de decisões judiciais serem cumpridas na prática.
Segundo o legista João Cánovas Bottazzo Ganacin, doutor em recta processual pela Universidade de São Paulo e sócio do escritório Dinamarco, Beraldo e Bedaque Advocacia, o Código de Processo Social de 2015 permite que o juiz utilize medidas de pressão sobre o devedor quando ele resistir ilegitimamente ao cumprimento de ordens judiciais. “É uma regra ocasião, que as deixa ao critério do juiz.”
Também há casos em que a Justiça determina a consumição da CNH.
“Há juízes que entendem ser uma medida provável; outros que é inconstitucional, porque levaria à imposição de medidas de restrição de liberdade por dívida, o que a Constituição só autoriza em casos específicos, uma vez que a prisão do pai que não paga pensão”, explica.
A decisão do STJ não foi julgada uma vez que recurso repetitivo (procedimento usado para o julgamento ser válido para outros casos sobre o tema). “Essa decisão segue a traço de outras já proferidas pelo STJ, mas não se pode proferir que a material está pacificada, principalmente entre julgadores de primeira e segunda instâncias”, diz Cánovas.
Segundo o legista, os tribunais entendem que esse não deve ser o primeiro caminho para cobrar a dívida. “Medidas uma vez que essa só devem ser adotadas depois terem sido tentados os meios tradicionais e mediante a mostra de que o devedor se vale de manobras para não executar a ordem de pagamento, apesar de ter recursos”, diz.
Para ele, é preciso desvelo com o uso indiscriminado da consumição de documentos. “Isso acabaria por penalizar pessoas economicamente fragilizadas, sobretudo com relação à consumição de CNH.”
O legista Marco Antonio da Costa Sabino, sócio do Mannrich e Vasconcelos Advogados e professor de processo social e recta empresarial, ressalta a preço de tentar outros meios antes. “O juiz tem que tentar impor multa, aumentá-la [caso a ordem seja descumprida], tentar bloquear bens”. Só logo a medida de consumição de passaporte ou CNH poderia ser legítima, afirma.
O Brasil é desde 1992 subscritor do Pacto de San José da Costa Rica, a Convenção Americana de Direitos Humanos da OEA —Organização dos Estados Americanos.
Entre outros dispositivos, a convenção proíbe a prisão por dívida, exceto em casos muito específicos, uma vez que da inadimplência de pensão alimentícia.
Estadão teor
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