A acirrada disputa pela prefeitura de São Paulo, marcada por cadeirada, laudo toxicológico falso e seguidas pesquisas indicando empate técnico triplo entre Guilherme Boulos (Psol), Ricardo Nunes (MDB) e Pablo Marçal (PRTB), culminou neste domingo (6) com eleitores indo às urnas em clima de incógnita sobre o resultado.
No Escola Mackenzie, o maior sítio de votação da cidade, com vendedores ambulantes postados no portão em meio ao fluxo de pessoas, praticamente todas as que usavam adesivos exibiam os materiais de Boulos. Rogério, vendedor de coco, fazia a propaganda do número 50 a cada garrafa que vendia.
Um grande M adesivado na ventre de uma mulher foi a única exceção durante a hora em que o Brasil de Veste esteve no sítio. Vanessa Hipólito, supervisora administrativa de 38 anos, estava “muito indecisa” até um dia antes da eleição.
Optou por Pablo Marçal depois que o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo suspendeu o perfil do candidato no Instagram por 48h. A decisão foi consequência da divulgação de um laudo comprovadamente falso que apontaria a internação de Guilherme Boulos em uma clínica por um surto psicótico e uso de drogas. “Para mim é increpação prévia [a Marçal], isso não está correto e por isso eu decidi meu voto”, conta Vanessa.
Adilano, vendedor de pipoca, não transferiu seu sítio de votação da cidade de Sousa, na Paraíba, para São Paulo. “Mas se pudesse votar, iria no Boulos”, diz. “Eu não concordo com todas as coisas que eles fazem, mas sou PT. Pelo nosso lado, de camelô, pelo povo do Setentrião, pelos projetos sociais, o Bolsa Família que é muito importante para o povo que não tem nem o que manducar”, explica.
Enquanto estourava mais pipoca para a movimentada venda em frente ao Mackenzie, ponderou que ficou “meio iludido pelo Marçal”. “O que me atrai é que ele fala de finalizar com esse monopólio dos partidos que estão sempre no poder. Aí ele fala para dar uma chance a ele, a gente acaba ficando até um pouco comovido”, contou, aos risos. “Mas ficaria com Boulos, porque ele pende mais para o lado dos pobres”, concluiu.
Bixiga
Bairro que nasceu do vetusto Quilombo da Saracura, o Bixiga foi um dos que, no pleito presidencial entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), mais registrou escora ao petista na capital paulista.
Neste domingo (6), a despeito de santinhos do prefeito Ricardo Nunes e seus vereadores espalhados pelo pavimento, secção considerável das pessoas que foi até a Escola Estadual Maria José para votar vestia camisetas com símbolos antifascistas, de movimentos populares, da Escola de Samba Vai-vai ou adesivos de candidatos do Psol, PT e PSB.
Para Marcela, mercante de 55 anos e moradora do Bixiga, a gestão de Ricardo Nunes “abandonou a cidade”. “Ninguém sabia o nome dele até um ano detrás, porque ele ficou três anos em silêncio, nem mostrou a rostro”, avalia, lembrando de denúncias de depravação envolvendo R$4,9 bilhões de gastos em contratos emergenciais, sem licitação.
Vestindo uma camiseta da Marielle Franco e três adesivos do candidato psolista, Marcela salientou que sentiu falta de maior radicalidade do seu candidato durante a campanha. “Fico triste de Boulos ter assumido uma postura ‘sossego e paixão’, esquecendo que o potente dele é ser potente, explícito e mostrar o que fez por meio do movimento social de habitação”, defendeu.
Em Higienópolis, bairro de classe subida de São Paulo, os tradicionais pontos de votação dos colégios Sion e Rio Branco receberam, pela manhã, um público majoritariamente idoso e branco, mas com preferências eleitorais diversas.
“Acho que o sentimento hoje é o de não conseguir prever zero”, diz Flávio Roberto, mercante de 33 anos, ao chegar para votar. “Rolou muita baixaria nos debates, é uma postura que eu não concordo. A campanha foi marcada por um querendo combater o outro, com pouco debate sobre política pública”, avalia. “Voto em quem se preocupa com isso, não com quem parece que só quer vender cursos”, diz.
Dolores, aposentada de 70 anos, diz que “quer mudança” e que está “arriscando, porque uma vez que não é uma pessoa da política, é uma caixinha de surpresa”. Moradora de Higienópolis, ela diz que esta eleição está “uma vez que se você entrasse em uma mansão de jogo. Está tudo muito incerto”.
Ao lado do Escola Sion, Fábio, varão em situação de rua, assistia sentado na lajeada o público para quem ele costuma pedir umas moedas mas que, neste domingo, foi impedido pela Polícia Militar. Aos 50 anos, o sergipano diz que esta é a oitava eleição na quela ele não vota. “Não muda zero. Se esta política deles fosse boa, o mundo não estava desse jeito. Só tem arrogância”, resume.
Passando vagarosamente na sua frente com uma bengala, Benedito Nicotero, engenheiro jubilado de 86 anos, contou que não perde uma eleição. “Vou votar enquanto eu viver”. Em 1964, quando houve o golpe empresarial militar no país, Benedito presidia a União Estadual dos Estudantes. Teve que se exilar na Argélia e na Nigéria.
“Eu acho que São Paulo precisa de um estadista, porque São Paulo tem um orçamento maior que muito estado da federação e o nosso problema não é de asfalto, o nosso problema é humano, é gente na rua, gente passando lazeira, é a ocupação de áreas de preservação”, opina Benedito.
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