Ives Gandra – 27/06/2024 11h43
O Brasil atingiu, segundo os jornais da última semana, zero superior a R$ 1 trilhão da dívida pública. O tórax fiscal faz chuva e as previsões para cima (déficit horizonte) crescem; por enquanto, com a promessa de que o superávit solicitado somente ficará menor.
Roberto Campos ironizava, no pretérito, que as promessas dos detentores do Poder comprometiam somente as pessoas que as ouviam. No caso, os economistas do mercado, pois são realistas, sabem que dificilmente as promessas do governo Lula sobre o tórax serão mantidas.
O claro é que o governo não tem merecido a crédito do empresariado brasiliano, circulando nos jornais no início do mês uma nota de repúdio das cinco mais fortes confederações de empresários (lavra, transacção e serviços, indústria, cooperativa e transporte) à negativa de créditos legítimos que as empresas têm de PIS/Cofins para gratificar a desoneração da folha de serviços negociada com o Legislativo e desrespeitada com a Medida Provisória nº 1.202/2023, que o Congresso Vernáculo devolveu ao governo.
Desde o último dia 12, o dólar oscila entre R$ 5,40 a R$ 5,52 e a Bolsa caiu quase dois pontos percentuais. Pesou neste cenário a fala do presidente que prometeu aumento de tributação e queda de juros, o que afetaria o único instrumento atual de combate à inflação, que é a política monetária.
Nesse quadro, resolveu o governo, com a catástrofe climática do Rio Grande do Sul, importar arroz. A Confederação Vernáculo da Cultura, todavia, mostrou a desnecessidade da importação, pois mais de 4/5 da safra do Rio Grande do Sul já tinha sido colhida e o risco de desabastecimento é rigorosamente nenhum.
Transcrevo trecho do livro que escrevi com Samuel Hanan, que demonstra a influência do agronegócio para o Brasil e a equivocada visão governamental:
“Agrobusiness brasiliano (2023)
– 26 a 30% do PIB Brasil (+ 600 bilhões de dólares) (2.130 bilhões de dólares);
– 49 a 50% das exportações brasileiras (166,55 bilhões de dólares);
– 150% do saldo da balança mercantil (150 bilhões de dólares) – saldo Brasil: 98,84 bilhões de dólares;
– 30% dos empregos formais;
– 40% da produção mundial de soja (multíplice);
– 50% da produção mundial de açúcar;
– 30% da produção mundial de moca;
– 80% da produção mundial de suco de laranja;
– 25% da produção mundial de mesocarpo bovina;
– 30% da produção mundial de mesocarpo de frango.
Brasil = Potência mundial de produção de provisões. BRASIL: 2,6% da população mundial” (Manadeira: Brasil – Que país é esse? – Editora Valer, pg. 41).
Ora, no momento em que o governo resolve comprar no exterior arroz que temos, à evidência prejudica empregos e empresas brasileiras que poderiam fornecer o resultado.
A reação do setor do agronegócio tem sido, pois, congruente e imediata. Explicam, à exaustão, a desnecessidade da importação, mostrando que o governo gastaria quantia que não tem, levando em consideração sua dívida e, por outro lado, prejudicaria empregos de produtores e comerciantes de arroz que tradicionalmente atuam no país.
O governo, todavia, fez o primeiro leilão e empresas sem nenhuma tradição no mercado e sem força econômica suficiente ganharam, o que o obrigou a cancelá-lo, por pairar ainda a suspeita de ilicitude no pregão.
A grande questão que se coloca é a seguinte: se não temos quantia para gastar num tórax fiscal cada vez mais inconfiável, se o governo não precisaria importar porque tem arroz suficiente para o Brasil, se nossa dívida chegou a mais de R$ 1 trilhão, por que importar arroz, vale expor, queimar divisas para comprá-lo no exterior?
Não gostaria de lembrar Shakespeare, embora pertença à Liceu William Shakespeare, mas que há um tanto de muito incorrecto nas finanças do Governo Federalista, não há incerteza de que há.
Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O Estado de São Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Tropa (Eceme), Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federalista da 1ª Região, professor honorário das Universidades Sul (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia), doutor honoris desculpa das Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS, catedrático da Universidade do Minho (Portugal), presidente do Juízo Superior de Recta da Fecomercio-SP e ex-presidente da Liceu Paulista de Letras (APL) e do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp). |
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