Desrespeitoso e cruel. Essa é a forma porquê Nádia Silva, de 32 anos, encara o veto totalidade do presidente Lula ao projeto de lei que buscava prometer uma indenização de R$ 50 milénio acrescida de uma pensão vitalícia a crianças com a Síndrome Congênita associada à infecção pelo vírus Zika. Ela é mãe de Lorena, de 8 anos. Quando estava pejada, foi infectada pelo vírus e, em decorrência do caso, sua filha nasceu com microcefalia. Para manter terapias e acompanhamentos multidisciplinares que a moçoila precisa, os gastos são muitos.
Na última quinta-feira, 9, o presidente Lula fez duas grandes movimentações em torno do tema. Primeiro, ele vetou um projeto de lei, que tramita desde 2015, sobre o recta à indenização por dano moral e a pensão às crianças com a síndrome congênita do vírus Zika. Depois, ele instituiu um suporte financeiro, de parcela única, no valor de R$ 60 milénio a essas mesmas famílias por meio de uma Medida Provisória.
Para Nádia, que também é diretora da Associação Lótus, que acolhe crianças com a síndrome do Zika no estado do Rio de Janeiro, e representante da Unizika, organização vernáculo dedicada à luta por políticas públicas para as famílias afetadas pela síndrome, o valor de R$ 60 milénio está longe do ideal.
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“Ou a gente, enquanto familiar, dá nosso jeito, dá nossos pulos e arruma numerário de onde a gente não tem, fazendo campanhas para que a gente consiga pelo menos remunerar um jurisconsulto para lutar por nossos direitos, ou as crianças morrem”, pontua a mulher.
Ela contou ao Terreno que, quando sua filha nasceu, precisou parar de trabalhar. O parto aconteceu em uma segunda-feira, na sexta-feira elas tiveram subida e, na segunda-feira seguinte, já precisaram voltar ao hospital para seguirem com acompanhamentos. Para ela, não teve tempo de resguardo e puerpério.
Desde logo, Nádia diz serem anos de luta, passando com a filha por serviços públicos, outros com cobertura de seu convênio médico – que teve que judicializar – e, em casos onde não teve outra saída, precisou bancar o pessoal. “É lutar o tempo inteiro por tudo. O que dói em mim e nas outras mães não é ter um fruto com deficiência. O que dói na gente é a deficiência do Estado brasiliano que não dá o mínimo de suporte para essas famílias”, acredita.
Lorena é uma entre as 1.828 crianças que tiveram a infecção congênita da Zika confirmada, segundo dados do Ministério da Saúde. Ainda de negócio com o ministério, de 2015 a 2023 foram registrados 261 óbitos.
A Síndrome Congênita associada à infecção pelo vírus Zika (SCZ) foi invenção em 2015. A principal forma de transmissão é pela picada da fêmea do mosquito Aedes aegypti, o mesmo responsável pela dengue. Ou seja, há oito anos, quando Nádia deu à luz Lorena, tudo era muito recente.
Receber uma indenização do governo – vetada por Lula –, para Nadia, seria uma forma de reconhecimento de que o Estado falhou com relação à erradicação do vetor, o mosquito Aedes aegypti, que transmite o vírus Zika. “A gente precisa ter esse reverência, tanto da sociedade, quanto do Estado brasiliano. Saudação e reconhecimento do erro para que essas famílias sejam reparadas”, considera.
Do projeto ao veto: entenda a risca do tempo
Em 2015, a logo deputada Mara Gabrilli – agora senadora – elaborou um projeto de lei (3974/2015) sobre o recta à indenização por dano moral e à pensão vitalícia para pessoa com deficiência decorrente de síndrome congênita associada à infecção pelo vírus Zika.
Em 2020, o logo presidente Jair Bolsonaro assinou uma Medida Provisória, convertida em lei (13.985/2020), que instituiu uma pensão próprio e vitalícia, no valor de um salário mínimo, destinada a crianças com a Síndrome Congênita do Zika Vírus nascidas entre 2015 e 2019. Nesse caso, foram contempladas unicamente as famílias assistidas pelo programa Favor de Prestação Continuada (BPC).
Em dezembro de 2024, o PL sobre a indenização de R$ 50 milénio a essas famílias, junto com a oferta de uma pensão vitalícia de valor equivalente ao maior salário de favor do Regime Universal de Previdência Social (RGPS) para além dos assistidos do BPC, teve sua versão final do texto votada e aprovada na Câmara. O projeto foi guiado para o presidente Lula – que, por sua vez, optaria por sancionar ou vetar, de forma totalidade ou parcial, o projeto.
Nesta quinta-feira, dia 9, o presidente Lula determinou veto totalidade ao PL em questão. No argumento, a Presidência da República afirmou que, ouvidos, os ministérios da Rancho; do Planejamento e Orçamento; do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Lazeira; da Previdência Social; dos Direitos Humanos e da Cidadania; e a Advocacia-Universal da União manifestaram-se pelo veto.
Foram usados porquê argumentos questões econômicas, por se tratar de uma proposta que “cria despesa obrigatória de caráter continuado e favor tributário e amplia favor da seguridade social, sem a devida estimativa de impacto orçamentário e financeiro, identificação da nascente de custeio, indicação de medida de indemnização e sem a fixação de cláusula de vigência para o favor tributário”.
O veto também frisou que “a teorema diverge da abordagem biopsicossocial da deficiência, contraria a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e cria tratamento não isonômico em relação às demais pessoas com deficiência”. Para um veto ser rejeitado, é preciso o voto da maioria absoluta de deputados e senadores.
Ainda na última quinta-feira, dia 9, Lula publicou no Quotidiano Solene da União uma medida provisória (1.287/2025) instituindo um suporte financeiro, único, de R$ 60 milénio, à pessoa com deficiência decorrente de síndrome congênita associada à infecção pelo vírus Zika. Para receber, será necessário fundamentar a relação entre a síndrome congênita e a contaminação da genitora pelo vírus Zika durante a gravidez, assim porquê a constatação da deficiência da rapaz. A MP segue em tramitação.
E as pessoas beneficiadas pela lei aprovada no governo Bolsonaro? Segundo o governo federalista, o novo suporte financeiro de R$ 60 milénio instituído por Medida Provisória não interferirá no caso das pessoas que foram contempladas pela pensão mensal e vitalícia da lei de 2020. Nesse caso, o suporte financeiro vem porquê um complemento. A reportagem solicitou ao governo federalista dados sobre quantas famílias recebem esse favor, mas não obteve resposta.
Rotina e custos
Lorena já passou por duas cirurgias. A primeira foi um procedimento de tenotomia, de distensão de tendão, porquê explicou a mãe. Ela fez pelo Sistema Único de Saúde (SUS) quando tinha três anos. Já em 2023 ela precisou operar o quadril. Conseguiu pelo projecto de saúde e, sem reembolso, ainda precisou remunerar R$ 800 para custos adicionais porquê o anestesista. A luxação operada era bilateral e, segundo conversa de Nádia com o médico responsável pelo procedimento, a operação custaria em torno de R$ 24 milénio por lado.
De negócio com dados do Sistema de Informações de Nascidos Vivos (Sinasc) divulgados pelo governo federalista, de 2015 a 2023 foram registrados 1.510 nascidos vivos com luxação congênita do quadril. Nadia se considera excessão, por ter conseguido custear a cirurgia de forma privada, sem precisar enfrentar as filas do sistema público.
E tudo custa dispendioso. Nádia contou que precisou buscar por um novo ortopedista para a filha e que as consultas custam em torno de R$ 700. A moçoila também iniciou tratamentos com canabidiol e fez um eletroencefalograma, que custou R$ 2 milénio, que o projecto de saúde não cobriu. “Agora eu vou ter que remunerar mais R$ 600 de uma consulta e mais R$ 2 milénio de um novo eletro, porque é preciso saber se está fazendo efeito”. Isso além de gastos com uma cadeira de rodas boa, talas extensoras, órtese, colete postural. Se recebesse a pensão do governo, ela diz que garantirá melhores acompanhamentos para a filha. O marido de Nádia trabalha com carteira assinada e, devido à renda da mansão, eles não têm recta ao BPC – por isso, ficaram de fora da leva que passou a receber pensão próprio a partir da lei de 2020.
Natividade/Créditos: Terreno
Créditos (Imagem de capote): Foto: Registo Pessoal