Porto Satisfeito, cidade onde foi criado o dia da Consciência Negra, pela primeira vez terá feriado. Isso porque o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou, em dezembro do ano pretérito, a lei que inclui o Dia da Consciência Negra no calendário de feriados nacionais. Para marcar o 20 de Novembro, acontecerá na próxima terça-feira (19), a Marcha Independente Zumbi e Dandara 2024: “Estirão por Justiça, Memória e Resistência”, organizada pelo Novembro Antirracista Unificado, no meio da capital gaúcha. A concentração será na Esquina Democrática, a partir das 17h.
De tratado com os organizadores, levante ano, a marcha ocorre em um momento de profunda reflexão sobre as condições de vida e pundonor das populações negras e carrega um significado ainda mais profundo, pois marca os 180 anos do Massacre de Porongos, incidente ocorrido em 1844. “Levante foi um dos momentos mais cruéis da Guerra dos Farrapos, em que tropas imperialistas atacaram covardemente os lanceiros negros que lutaram com a promessa de liberdade. O massacre é um símbolo histórico da luta pela pundonor e pela liberdade. Relembrá-lo é honrar a memória dos que foram injustiçados e reafirmar a luta contra o racismo estrutural”, destacam.
Conforme pontua o integrante do Coletivo Pela Paridade Racial do Sindjus/RS Luiz Osmar Mendes, a jornada se tornou um momento importante na luta do povo preto.
“A marcha faz com que a gente encha o coração de alegria e, ao mesmo tempo, ela leva as nossas reivindicações. Leva as nossas palavras de ordem e labareda a população mostrando: ‘olha, esse povo cá precisa de você, preto, não preto, prensa, governos, o Estado. Na verdade, a marcha é o momento da gente levar o nosso recado ao Estado Brasiliano. Do nosso jeito.”
“A gente costuma expressar que não é um momento de comemoração, e sim momento de luta. Mas penso que também é um momento de comemoração, porque nós também precisamos comemorar: ao longo do tempo a gente sempre foi resistência. Temos esse recta. A maioria da população gaúcha não sabe porque é feriado 20 de Novembro. Nem vai entender o feriado. E nós precisamos expressar pra eles o porquê desse feriado”, complementa a presidenta da União de Negras e Negros pela Paridade no Rio Grande do Sul (Unegro/RS), Elis Regina Duarte Gomes.
Construção coletiva
Elis e Luiz destacam o processo de construção do Novembro Preto nos últimos anos, fruto da coletividade, e sobre as conquistas advindas. “Hoje nós temos uma lei que determina a Semana da Consciência Negra do Estado do Rio Grande do Sul, de 14 a 20 de novembro. Dia 14, por motivo do massacre de Porongos, em Pinho Machado, quando os nossos lanceiros foram assassinados pelos Farrapos e Duque de Caxias. E o dia 20, em homenagem ao líder do Quilombo dos Palmares, morto nessa data em 1695”, expõe Luiz.
De tratado com Elis, atualmente muro de 40 entidades compõem a organização, entre movimentos sociais, coletivos, sindicatos. “A cada ano que passa, mais gente tem vindo conosco. E o melhor de tudo, mais gente não negra. Todas as entidades, agremiações, pessoas independentes que queiram erigir com a gente são bem-vindas. A participação está sempre ensejo para todos, para que possamos erigir uma marcha mais democrática e ampla provável, quase uma frente ampla, é essa que a gente sonha.”
Além da marcha, o movimento organizou também um mês todo devotado a atividades. A programação pode ser acompanhada no Instagram da marcha.
Pautas essenciais
Entre as atividades está uma audiência pública na Tertúlia Legislativa, às 18h30, do dia 22 de novembro, para discutir retrocessos políticos, entre eles, a autodeclaração de candidatos uma vez que negros. Nas eleições municipais deste ano, seis capitais elegeram homens autodeclarados negros, que antes da disputa se declaravam brancos.
“O ano de 2024, para nós, negros e negras, inicia com algumas perspectivas. Mas aí a enchente, a eleição, pioraram um pouco mais as nossas vidas. A nossa luta, com certeza, vai ter que ser mais incidente, mais incisiva, mais poderoso, mais trabalhada. E o movimento sindical e o movimento preto são peças essenciais nesse trabalho”, pontua Luiz.
Habitação, moradia digna, saúde e instrução da população negra, ações afirmativas, participação política, violência e sobrevivência, estão entre as pautas trabalhadas durante o mês de novembro e que serão levadas para a marcha.
“Hoje nós somos mais de 50% da população. Mas, mesmo sendo assim não estamos nos espaços de poder. A instrução, a cultura afro-brasileira africana, infelizmente, não consegue adentrar nas escolas, mesmo com um projeto de lei que tem mais de 20 anos. São inúmeras questões que são colocadas em 2024”, pontua Luiz.
Conforme complementa Elis, a construção das pautas foi coletiva, e a mesma perpassa por muitos lados. “Porque, na verdade, ainda hoje, quem está na base da pirâmide somos nós.”
Conforme destacam os organizadores além das tragédias recentes, a Marcha Independente Zumbi e Dandara lembrará que os desafios históricos do povo preto persistem, uma vez que a luta pelo termo do genocídio da população negra, a falta de políticas públicas nas comunidades e a exclusão do mercado formal e digno de trabalho.
“Enquanto a gente tiver racismo, mesmo que seja institucional, que é um racismo muito doloroso, o Brasil não vai ser um país desenvolvido. Porque não dá para ser um país desenvolvido se deixa à margem mais de 50% da sua população, que é a maioria da população brasileira. Nós já passamos da temporada de permanecer chorando as nossas dores e lambendo as nossas feridas. Nós estamos na temporada de prosseguir, e de ter direitos, uma vez que todo cidadão brasílio”, afirma Elis.
Elis e Luiz reforçam o invitação para que todos participem das atividades do Novembro Preto, com destaque para a marcha. “Para além da marcha, a gente leva a nossa música, a nossa dança, as nossas palavras de ordem. A marcha é um momento onde a gente labareda a população negra e não negra para refletir conosco quais ações, quais atividades, que outras coisas a gente pode estar fazendo para mudar essa perspectiva da luta antirracista no Brasil”, destaca Luiz.
“Porto Satisfeito tem vários lugares simbólicos. E hoje a gente vê a desterritorialização completa, porque agora o para reles não é mais nosso, o para cima não é mais nosso. E a gente foi parar na periferia das cidades e tudo isso para nós é luta. Tem um simbolismo gigantesco. Vai ser um prazerzão a galera vir com a gente e fazer uma grande marcha. Que demonstra toda a nossa felicidade, nossa força de viver, mas também que vem reivindicando, denunciando e mostrando todas as mazelas que ainda existem nos países e que nós ainda precisamos lutar muito para chegar no lugar que a gente quer chegar, ou seja, no lugar de todos nós sejamos felizes, independentes da cor da pele”, finaliza a presidenta da Unegro.
Aquém o calendário das próximas atividades do Novembro Antirracista Unificado no RS:
16 de novembro
Carnaval na Comunidade Restinga
18 de novembro
Cicatrizes Invisíveis: A verdade da violência contra a mulher
Organização: Frente Negra Gaúcha
Lugar: Tertúlia Legislativa
18 a 23 de novembro
Semana da Consciência Negra de Taquara
Organização: Instituto Pró-Cidadania
19 de novembro
Marcha Zumbi e Dandara
Meio de Porto Satisfeito
20 de novembro
Feriado Vernáculo e atividades descentralizadas pelo Estado do RS
21 de novembro
Homenagem a professora Petronilha na UFRGS
22 de novembro
Homenagem do procuração da deputada federalista Reginete Patriarca
23 de novembro
Sarau do Vermelhão na Vila Maria da Conceição
25 de novembro
Seminário referente ao 20 de novembro dos Correios
30 de novembro
Jantar Dança com Dani Rosa e Orquestra Black
Organização: Frente Negra Gaúcha
Lugar: Associação dos Servidores do Tribunal de Contas (R. Itapitocaí, 675 – Cristal, POA)
Manancial: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Katia Marko