A campanha contra a graduação 6×1, que impõe seis dias de trabalho para um dia de folga, tem ganhado força na sociedade e impulsionado uma agenda universal da classe trabalhadora, abrindo uma janela para a retomada do debate sobre relações trabalhistas e subtracção da jornada.
A petição pública online, lançada pelo movimento Vida Além do Trabalho (VAT), ultrapassou 2 milhões de assinaturas. Depois da aprovação da lei da política de valorização permanente do salário mínimo, sancionada pela presidenta Dilma Rousseff em 2012, é a primeira vez que uma taxa com o caráter de conquista de direitos trabalhistas demonstra apelo popular e força na cena política.
Nesse período, o Brasil passou por uma ofensiva da mediocracia, que levou ao impeachment de Dilma Rousseff em 2016. Um dos principais objetivos foi diminuir o dispêndio da força de trabalho. A reforma trabalhista em 2017, bastante desfavorável para os trabalhadores, foi uma reação à queda do desemprego e ao aumento da participação dos salários no PIB, que teve um propagação de 4% entre 2004 e 2013, retomando o patamar de 1995.
Desde logo, a agenda dos direitos trabalhistas ficou obstruída, inclusive no debate com a sociedade. A ofensiva ideológica para impor o desmonte da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prometia “modernizar” a legislação, diminuir a burocracia e aumentar a oferta de vagas de ocupação. Não foi o que aconteceu.
Estudo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), publicado em 2022 com base na simulação de cenários comparativos do Brasil com países da América Latina e do Caribe, apontou que a reforma não apresentou efeito estatisticamente significativo sobre a taxa de desemprego. Caiu mais uma mistificação neoliberal.
Agora, a adesão à campanha pelo término da graduação 6×1 e a subtracção da jornada de trabalho é um traje novo que coloca em movimento a luta em resguardo dos direitos da classe trabalhadora. O primeiro sinal da força dessa bandeira foi a eleição de Rick Azevedo (Psol-RJ), líder do movimento VAT, com uma votação expressiva de 29 milénio votos para vereador na cidade do Rio de Janeiro.
O jovem de 30 anos ganhou notoriedade nas redes sociais com denúncias da exploração que sofreu quando trabalhava no negócio na graduação 6×1. A partir disso, assumiu a luta com centralidade, criou o movimento VAT e passou a fazer uma ação permanente nas redes sociais e em regiões do negócio no Rio para conversar com os trabalhadores. É o famigerado trabalho de base.
Agora, ganha um novo impulso com a repercussão da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da deputada federalista Erika Hilton (Psol-SP), que propõe finalizar com a graduação de trabalho 6×1 com a redução da jornada de trabalho para 36 horas semanais, sem modificação na fardo máxima diária de oito horas e com a manutenção dos salários.
Uma ação nas redes sociais pressiona parlamentares a assinar o texto para que a PEC possa ser protocolada. São necessárias 171 assinaturas para o projeto ser apresentado à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. Depois de invernar por meses, obteve nos últimos dias mais de 130 assinaturas e deve perceber o número mínimo até o final desta semana.
Até mesmo parlamentares de extrema direita, porquê Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Nikolas Ferreiras (PL-MG) e André Fernandes (PL-CE), sofreram constrangimentos e receberam críticas por não assinarem o texto da PEC. Uma vez que justificar que um trabalhador tenha somente um dia por semana para resfolgar?
A jornada de oito horas de trabalho por seis dias na semana simboliza a perversidade da exploração da classe trabalhadora em pleno século 21. Zero justifica que um trabalhador tenha somente um dia para resfolgar e permanecer com a família. É o gavinha fraco da classe dominante no debate sobre as relações trabalhistas.
Esse regime de trabalho é geral, sobretudo, no negócio e no varejo. Somente nesse segmento são mais de 19 milhões de trabalhadores, que estão empregados em lojas, supermercados e shoppings que permanecem abertos praticamente todos os dias
No entanto, não é uma exclusividade do negócio. Indústrias que atuam com produção contínua (petroquímica, alimentícia, farmacêutica etc), serviços de saúde porquê hospitais e clínicas, setor de transporte e logística, setor de hotelaria e turismo, serviços de segurança e vigilância e até mesmo na construção social exigem essa graduação.
A tramitação da PEC tem vários passos e a aprovação depende do espeque de pelo menos 3/5 dos deputados federais (308) e senadores (49). Por isso, requer uma intensa mobilização da sociedade brasileira, com protagonismo do movimento sindical e uma poderoso adesão da classe trabalhadora.
É uma oportunidade, inclusive, para o governo Lula trespassar das cordas e mudar a agenda vernáculo, diante da pressão do capital financeiro e dos meios de informação empresariais para fazer um ajuste fiscal com o incisão de benefícios sociais. Por que não abraçar e estimular uma luta pela subtracção da jornada de trabalho que pode colocar seus inimigos na defensiva?
A luta pelo término da graduação 6×1 tem potencial de reconectar as organizações do campo democrático-popular com segmentos expressivos da classe trabalhadora. É uma bandeira simples, justa e direta, que incide sobre uma prática desumana que expõe a exploração do mercado de trabalho na atualidade.
Um movimento vernáculo para finalizar com a exploração da graduação 6×1 pode colocar a classe trabalhadora em movimento e mudar a reciprocidade de forças. Marchar para obter uma vitória pode resgatar a auto-estima dos trabalhadores e a esperança na organização e na luta.
* Igor Felippe Santos é jornalista e comentador político com atuação nos movimentos populares.
*Nascente é um cláusula de opinião e não necessariamente representa a risco editorial do Brasil do Traje.
Edição: Thalita Pires
