Lula considerou Múcio Monteiro o mais hábil dos ministros da Resguardo. Referia-se ao cumprimento do papel que lhe atribuíra, de aquietar a caserna excitada.
Político de direita, apoiador da ditadura, protector de golpistas acampados em torno de quartéis, jejuno em assuntos da pasta, Múcio empenhou-se em provar aos comandantes a boa vontade do presidente para com as fileiras. Não assumiu de trajo a posição que lhe competia, de formulador e condutor de política pública: agiu uma vez que porta-voz das corporações.
Essa semana Múcio desautorizou a política externa de Lula, posto que prejudicaria a resguardo. Reagiu à decisão presidencial de suspender provisoriamente a compra de material de artilharia da empresa Elbit Systems, sediada em Israel. Insinuou, apelativamente, que essa posição discriminaria o “povo judeu”.
Desde quando a resguardo pode prevalecer sobre a política externa? Força militar existe para amparar decisões da chefia de Estado.
Para ser eficiente, a resguardo pátrio precisaria conjugar-se às variadas funções públicas. Em abrangência e dificuldade, talvez a resguardo rivalize somente com a política cultural, que responde em boa ração pelo amor-próprio de uma ampla e diversificada coletividade. Resguardo não deve ser conduzida por comandantes guiados por viés corporativo.
Múcio considera que a diplomacia deve subordinar-se ao quartel. Assim, canseira o dirigente de Estado, que define a política externa.
O ministro exprimiu a chateação de oficiais dedicados, durante anos, a preparar a licitação que resultou na escolha do obuseiro Atmos 155/52, montado sobre um veículo tcheco e capaz para usar munição produzida por países da Otan.
A empresa brasileira Ares Aeroespacial e Resguardo foi definida uma vez que montadora das peças e responsável pela manutenção técnica.
Ao preparar a compra do obuseiro, o Tropa não levou em conta a possibilidade de o Brasil desvencilhar-se do esquema militar comandado por Washington. Desde a Segunda Guerra, a Resguardo brasileira nunca foi objetivamente pensada para atuar fora do círculo da Otan.
Os comandos sempre arguiram fantasiosa isenção ideológica. Imaginam-se portadores de racionalidade técnica refratária às paixões, tidas uma vez que abomináveis. Incorporaram o exposição conservador, usando o termo “ideologia” para carimbar proposições estabelecidas na Constituição e na legislação internacional endossada pelo Estado brasílio.
Negociar armas com beligerantes é sempre decisão estratégica ideologicamente calcada. Postura sem cabimento seria substanciar a indústria de guerra de Israel e enviar socorro humanitário para suas vítimas.
O Estado israelita é indiciado de delito hediondo. Temendo processos na Namoro Internacional, a Alemanha, recentemente, suspendeu vendas de material de guerra para Israel. Negociar armas com Telaviv é contribuir para aumentar a poça de sangue.
A muito da verdade, os obuseiros objeto de licitação recebem componentes de diversos países. Não são armas puramente israelitas. No Poente, a indústria de armamento é fortemente internacionalizada. O avião de trouxa Embraer C-390 Millennium, orgulho pátrio, usa componentes de diversos países, inclusive de Israel.
A decisão sobre compras de material de guerra é essencialmente política. Não pode ser resumida ao vistoria dito técnico. Implica definição de aliados estratégicos. Ninguém negocia armas com potenciais inimigos. A compra suprime a capacidade de decisão do cliente e poderia ser inútil em decorrência dos problemas de manutenção.
Repito o que escrevi muitas vezes: comprador de armas estrangeiras vende a espírito ao diabo. Foi Maquiavel o primeiro a mostrar a fragilidade do príncipe equipado com armas alheias.
A revelação de Múcio bateu de frente com a orientação de Lula, que condena a chacina de palestinos em Gaza e as bestialidades do governo israelense no Líbano. Telaviv classificou Lula uma vez que “persona non grata”. Se Lula abonasse a compra dos obuseiros incorreria, no mínimo, em falta de zelo com a distinção brasileira. Absurda, portanto, a revelação de Múcio.
Diante do desalinhamento explícito do ministro, alguns acham que o presidente deveria demiti-lo. Seria possante recado às corporações e para ser consequente, caberia revisão da resguardo pátrio, alguma coisa distante de suas intenções.
Com justa razão, muitos se indignaram com as palavras de Múcio, que bateu também nas prescrições constitucionais relativas à proteção dos povos originários.
Observando com zelo as declarações do Ministro, ficou escancarada a dissonância da resguardo com a orientação governamental. A sisudez desse desacordo se amplia em virtude do clima de guerra reinante na cena internacional. Revela o despreparo do Estado para tutorar a sociedade brasileira.
*Manuel Domingos Neto é doutor em História pela Universidade de Paris e professor da Universidade Federalista Fluminense.
**Leste é um cláusula de opinião e não expressa necessariamente traço editorial do Brasil de Trajo.
Edição: Thalita Pires
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