Uma audiência de conciliação foi realizada nesta quarta-feira (25), no Supremo Tribunal Federalista (STF), para buscar saídas ao agravamento da situação na Terreno Indígena (TI) Ñanderu Marangatu, localizada no município de Antônio João (MS). A sessão foi convocada pelo ministro Gilmar Mendes em seguida uma série de episódios de violência, que resultaram na morte do jovem Neri da Silva, de 23 anos, no dia 18 de setembro.
Pelo menos outros dois territórios indígenas na mesma região registraram incidentes violentos: a TI Panambi-Lagoa Rica, próxima a Douradina, e a TI Amambaipeguá I, localizada em Caarapó, ambas no Mato Grosso do Sul.
Porquê resultado da audiência, ficou acordado que a União arcará com o pagamento subitâneo dos R$ 27 milhões sobre as benfeitorias realizadas nos imóveis e outros tapume de R$ 102 milhões em rogatório. Já o estado do MS deverá aportar R$ 16 milhões, totalizando mais de R$ 146 milhões em indenizações aos fazendeiros.
Também constará no conformidade que as partes se abstenham de provocações ou qualquer ato de violência e que a Polícia Militar (PM) não utilize a força contra a população originária. Os fazendeiros devem vazar a superfície em um prazo de 15 dias em seguida o pagamento das benfeitorias.
No início da reunião, o juiz Diego Veras, superintendente de gabinete do ministro Gilmar Mendes e coordenador da audiência, defendeu o “término do estado de guerra” na região e a procura por alternativas constitucionais e legais para a solução do conflito. Já o representante da Advocacia-Universal da União (AGU) esclareceu que o órgão atua na perspectiva de manutenção do decreto e balizamento de uma solução indenizatória, e defendeu que, para além do caso específico, se possa seguir na solução de processos judiciais que correm em primeiro e segundo intensidade relacionados com processos de demarcação de terras indígenas.
Por sua vez, o representante do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), o legisperito Eloy Terena, defendeu que qualquer conformidade realizado deve reconhecer a tradicionalidade da TI, sem redução da superfície. Porquê proposta, Terena sugeriu o reconhecimento, por secção do governo do MS, do cometimento de um erro no pretérito, ao conceder o título de propriedade das terras a particulares, ignorando a existência dos indígenas na superfície.
Dessa forma, se acrescentaria ao valor um recurso para indenizar os fazendeiros pelas terras que não foram ocupadas, mas que, segundo os fazendeiros, fazem secção de sua propriedade, chamado de Valor da Terreno Nua (VTN). Houve resistência dos representantes do governo do MS quanto a assumir a responsabilidade sobre o pagamento do VTN. Só ao final da audiência o governo concordou com o aporte para a solução definitiva.
Solução para ontem
Durante a audiência, os representantes da União chegaram a anunciar um “pré-acordo”, que contemplava a retirada imediata dos fazendeiros da região, garantindo a posse dos indígenas sobre a TI, em seguida pagamento de indenização por benfeitorias feitas no imóvel. Mas diante do impasse com o governo sul-matogrossense, pediram um “tempo breve” para que os demais órgãos federais e estaduais pudessem chegar a um entendimento sobre as demais ações indenizatórias aos fazendeiros, o que foi rejeitado por Roseli Ruiz, proprietária da Rancho Barra, sobreposta à TI, e pelos próprios indígenas, que exigiram uma solução imediata.
“Nós, porquê eles, queremos uma solução de conciliação, de negociação, porque se for para fazer isso, ‘ah, é a lei, é isso aí’, portanto tem que esperar na Justiça mais 20 anos. Não é o que nós queremos e nem eles. Logo, por obséquio, eu peço para vocês que nos deem a oportunidade, tanto para nós porquê para a comunidade, de dar um término nisso. Deposita as benfeitorias e faça a negociação, que eu saio e entrego [as terras] para eles imediatamente”, afirmou a fazendeira.
“Nosso povo está esperando, está rezando agora, está dançando. Hoje estão lá, embaixo daquela barraca, no pé daquele morro. Eu acho que o senhor nem imagina o que é uma pessoa, uma menino de 10, de 3 anos, passam num lugar desses. Superioridade, me desculpa a forma de me expressar, mas nós viemos em procura de respostas”, declarou um representante indígena.
A vereadora do município de Antônio João Inayê Lopes (PSD) também advogou por uma solução definitiva. “Eu quero expressar que nós queremos transpor daqui com o resultado. Independente de quem vai remunerar, nós queremos que se resolva. Nosso território tradicional precisa dessa solução hoje porque o limite já ultrapassou. Porque se continuar nesse enrolamento vai continuar mais gerando violência”, defendeu.
Finalmente, o juiz Diego Veras consolidou a proposta de conformidade, que ainda precisa ser homologada pelo plenário do STF, para que se dê o processo porquê encerrado. Segundo o magistrado, o conformidade deve ser pautado aos ministros do Supremo em sessão extraordinária na próxima semana.
O processo
Em 2005, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), declarou a posse permanente da superfície aos indígenas, criando a TI Ñanderu Marangatu, com 9.570 hectares, onde vivem tapume de 3 milénio indígenas. No mesmo ano, a família Ruiz Silva entrou com processo no STF alegando a propriedade da terreno. Desta forma, o portanto presidente do STF, ministro Nelson Jobim, deferiu o pedido de liminar suspendendo os efeitos do decreto presidencial, até uma decisão final do plenário da incisão, e remeteu o processo ao relator, o ministro Gilmar Mendes.
Na decisão mais recente, que convocou a audiência desta quarta-feira, publicada na segunda (23), Mendes reconheceu que o conflito envolvendo a validade do ato demarcatório da TI Ñande Ru Marangatú “é profundo, violento e destrói há séculos os projetos de vida de todos que lá se instalam”.
“A inércia do Estado brasílio no cumprimento de seus compromissos constitucionais e internacionais criou grave contexto de violência e instabilidade”, seguiu o ministro.
“Por outro lado, não podemos olvidar que, nos séculos que correram, também existem não indígenas de boa-fé que depositaram sua crédito no Estado e construíram suas vidas na região”, destaca.
Nesse sentido, o decano defendeu a procura por um “caminho consensual e não violento”, pelo que convoca a audiência de conciliação. Na decisão, Mendes afirma que o processo foi liberado para julgamento junho de 2023 e, portanto, aguarda ser posto em tarifa.
A ‘profissional’
Na Justiça, o quinteiro Pio Silva é representado por sua filha, Luana Ruiz Silva, fruto do enlace com Roseli Ruiz Silva, proprietária da Rancho Barra, sobreposta à TI Ñhande Ru Marangatu, onde o indígena Neri da Silva foi assassinado.
Recentemente, ela foi indicada pelo Partido Liberal (PL) e pelo Republicanos porquê “profissional” para ser ouvida pela percentagem de conciliação sobre o marco temporal, também coordenada pelo gabinete do ministro Gilmar Mendes. Roseli tem formação em antropologia e possui longo histórico de conflitos com os indígenas. Em 2015, ela era presidente do Sindicato Rústico de Antônio João, de onde, segundo relatos dos indígenas, teria partido um grupo de fazendeiros e jagunços para uma ação violenta, que resultou no homicídio de Simeão Vilhalva.
Em 2013, o jornal Folha de São Paulo publicou material com o perfil de Roseli. Com o título Fazendeira vira antropóloga e faz laudos contra índios, a material conta porquê ela decidiu pela profissão. “Fui invadida em 1998 e, no ano seguinte, fui fazer recta para entender esse desmando. No discurso do curso detectei que o que estava fundamentando não era a legislação, e sim um relatório antropológico”, afirmou em entrevista.
Já a filha, Luana, é primeira suplente ao incumbência de deputada federalista pelo PL na Câmara dos Deputados, e trabalha porquê assessora peculiar da Morada Social do Governo do Mato Grosso do Sul. Ela também foi secretária-adjunta na Secretaria Peculiar de Assuntos Fundiários do Ministério da Cultura no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Nas redes sociais, se diz “defensora do agro” e publica vídeos com ataques ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terreno (MST) e contra a demarcação de terras indígenas.
Durante a audiência desta quarta, a advogada considerou “inapropriado” o pedido dos indígenas para a fixação de uma cruz no sítio do homicídio de Neri da Silva, mas finalmente cedeu, para que a família possa realizar a cerimônia de despedida em data e hora definidas, com seguimento da Força Pátrio.
Edição: Thalita Pires
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