Existe um fio da história que perpassa a trajetória de Eunice e Rubens Paiva, que leva milhares aos cinemas para observar Ainda estou cá, e o projecto para matar Luiz Inácio Lula da Silva, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes e dar um golpe de Estado.
O processo de “transição lenta, gradual e segura” para a democracia, propalado pelo ideólogo da ditadura e general Golbery do Couto e Silva, obstruiu a implementação de medidas para superar a legado da Ditadura Militar (1964-1985) e romper com a tutela militar sobre a soberania popular.
Mais uma vez, estamos diante de uma mediação para efetivar um golpe gestado por militares. Não há dúvidas de que as digitais das Forças Armadas estão marcadas no projecto golpista em curso no Brasil. Essa operação não começou com o documento “Punhal Virente Amarelo“, com a planificação dos assassinatos com o uso de armamento pesado e a possibilidade de intoxicação das autoridades.
Teve seu prelúdio no golpe do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, passou pela elaboração do governo Michel Temer e a eleição de Bolsonaro. Manifestou-se de forma ocasião no tweet do portanto comandante do Tropa, o general Eduardo Villas Bôas, contra a autonomia do Supremo Tribunal Federalista (STF) para julgar um pedido de habeas corpus para Lula.
Os militares foram sócios do governo Bolsonaro, com generais exercendo o papel de ministro e conduzindo postos estratégicos. Mais de 6.000 militares ocuparam cargos e fizeram segmento da gestão, de negócio com levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU). Muitos tiveram participação na empreitada golpista, inclusive membros do comando das Forças Armadas, desacreditando o sistema eleitoral e as urnas eletrônicas.
Um dos momentos mais marcantes foi o desfile na Esplanada dos Ministérios com 150 carros de combate, tanques, blindados, aeronaves e lançadores de mísseis e foguetes, em agosto de 2021. A mostra militar aconteceu a pedido do portanto presidente Jair Bolsonaro, no mesmo dia da votação da PEC do voto impresso na Câmara dos Deputados e em meio ao conflito político-institucional do governo com o STF.
Posteriormente o segundo vez da eleição de 2022, grupos de bolsonaristas se concentraram em frente a unidades militares em todo o país para questionar a vitória de Lula. Em Brasília, foi montado um acampamento em frente ao Quartel-General do Tropa. Foram organizadas caravanas de todo o Brasil para visitar o sítio. Zero foi feito pelos militares para obstruir a sintoma.
O Tropa, inclusive, deixou que dezenas de caminhões ficassem em dimensão militar com faixas em resguardo do golpe com os dizeres “SOS Forças Armadas”. Militares caminhavam entre os manifestantes, observavam e interagiam. Maria Aparecida Villas Bôas, mulher do ex-comandante do Tropa e hoje general da suplente Eduardo Villas Bôas, passou de van no acampamento, sorrindo e aplaudindo ao indicar que o marido estava no carro.
No dia 8 de janeiro de 2023, o Tropa fez uma barreira com uma risca de três tanques de guerra na ingressão do setor militar, obstruindo o aproximação ao Quartel-General do Tropa. Assim, impediram que agentes da Polícia Militar entrassem no acampamento para fazer prisões dos bolsonaristas que atacaram as sedes dos Três Poderes. Em vez de tutorar a democracia, protegeram os golpistas.
Agora, a Operação Contragolpe da Polícia Federalista esquadrinhou com detalhes o projecto para dar um golpe de Estado no Brasil. Foram presos cinco membros da organização criminosa e 37 indiciados pela participação na operação para matar Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes.
O questionário da Polícia Federalista indiciou 25 militares, incluindo sete generais que fizeram segmento do comando militar em sua trajetória. Dos cinco presos, que compunham o chamado “Núcleo Operacional de Escora às Ações Golpistas”, quatro foram formados nas Forças Armadas, sendo um comandante e dois integrantes do Comando de Operações Especiais, os “kids pretos“, especializado em missões sigilosas de tá risco.
Os militares infestam de forma generalizada a democracia brasileira uma vez que uma espécie de térmita. Colônias formadas dentro do Estado perfuram toda a sua estrutura, consomem tudo por dentro e deixam somente uma fina estrato externa. Cada uma delas tem uma estrutura muito definida, com uma jerarquia com generais, tenentes, capitães e soldados.
O controle dos cupins exige métodos especializados, uma vez que o uso de iscas, barreiras químicas e inseticidas superficiais. No caso de infestações, requer um tratamento extensivo para fazer a eliminação dos ninhos e saber colônias ocultas.
A seriedade do projecto dos militares para matar Lula, Alckmin e Moraes exige medidas estruturais que devem ser assumidas pelas forças democráticas da sociedade brasileira para tutorar o Estado de Recta e impedir que o país fique mais uma vez a um passo de mais um golpe de Estado.
A prisão dos envolvidos no projecto golpista, derrotando a proposta de anistia defendida por Bolsonaro e seus apoiadores, é um passo importante, mas não é suficiente. Não basta moderar uma colônia de cupins, é necessário moderar a infestação que corrói a democracia brasileira e finalizar com o ninho que irradia uma teoria golpista.
É preciso modificar o cláusula 142 da Constituição Federalista que abre margem para a tradução de que os militares têm a privilégio para fazer uma mediação para prometer os poderes constitucionais, a lei e a ordem. Esse dispositivo é utilizado pelos apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), inclusive pelos articuladores do golpe, uma vez que o general Mário Fernandes, para quem “o fuzil não pode se pender diante da toga”.
Mais uma mudança urgente para combater a infestação é instaurar o encolhimento dos militares para o treino de funções públicas e políticas, impondo o princípio da “quarentena” (pausa entre as funções). Assim, aqueles que optarem por essas funções devem ir imediatamente para a suplente.
Para finalizar com o processo de formação de golpistas na curso militar, os currículos das escolas de oficiais devem ser alterados, eliminando valores antidemocráticos, uma vez que o saudosismo do Golpe de 1964 e do regime militar que existe até os dias de hoje.
Para isso, devem ser implementadas as recomendações do relatório final da Percentagem Vernáculo da Verdade, que fez um trabalho insólito durante dois anos para fazer o revista e justificação das violações de direitos humanos durante a ditadura.
As Forças Armadas precisam passar por uma profunda reformulação, que garanta que cumpram de forma exclusiva o papel de dedicação à resguardo pátrio e a programas de integração territorial, com a extinção do sistema de Justiça Militar que alimenta o corporativismo e a impunidade.
O Brasil tem a oportunidade de trinchar o fio da história que mantém a legado da ditadura e a tutela militar sobre a nossa democracia. Não existe soberania popular quando a decisão sobre respeitar ou não o resultado das urnas está submetida às Forças Armadas.
Tivemos neste ano a efeméride dos 60 anos do golpe militar de 1964. O presidente Lula declarou que a ditadura fazia segmento do pretérito e que não valia remoer, mas que iria “tocar o país pra frente”. Quem sabe esse projecto para chacinar o presidente e golpear novamente nossa democracia – que deixou Lula “estupefato”, segundo o ministro da Justiça Ricardo Lewandowski – deixe o ensinamento de que é impossível deixar pra trás um pretérito que nunca foi plenamente enfrentado.
Eunice Paiva passou a vida inteira lutando por memória, justiça e verdade. Liderou a luta pela orifício dos arquivos da ditadura, um tanto medial para o ajuste de contas com esse capítulo violento de nossa história. Os últimos anos de sua vida foram marcados por um estágio avançado de Alzheimer, e foi nesse momento que Eunice começou a proferir repetidas vezes a frase “ainda estou cá”.
É preciso enfrentar esse problema que, longe de estar no pretérito, bate à nossa porta mais uma vez. Se a prenúncio continua, é necessário cada vez mais encarar de frente. A força de Eunice deve nos servir uma vez que inspiração.
Eunice ainda está cá.
* Igor Felippe Santos é jornalista e crítico político com atuação nos movimentos populares.
** Oriente é um cláusula de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a risca editorial do Brasil de Indumento.
Edição: Nicolau Soares