Duas músicas dominam a noite da Rádio Comunitária Mumbaça FM: uma rádio do povo (104,9). Primeiro, às 19h, O Guarani, de Carlos Gomes, anuncia o início de A Voz do Brasil, programa que completa nesta segunda-feira (22), 89 anos de transmissão.
A outra música que mexe com a comunidade quilombola Mumbaça, na cidade de Traipú (AL), é o Hino à Negritude, que toca às 20h, logo que o histórico programa acaba. Fora as músicas, a emissora leva informação às 400 famílias que moram no lugar.
“A Voz do Brasil tem uma influência para a gente por conta da notícia”, diz o colono Manoel Oliveira, de 53 anos. Uma vez que ele é gestor da associação de moradores da comunidade, também trabalha na rádio.
“É logo que sabemos o que acontece nos ministérios, no Congresso e na Justiça. O colono faz questão de seguir”. No lugar, praticam cultura de subsistência principalmente com mandioca, milho, feijoeiro, inhame e mendubi. “Eu acompanho A Voz do Brasil sempre cá na rádio”.
Opção unificada
O programa ainda tem transmissão obrigatória no país, mas teve o horário flexibilizado. Segundo avalia a professora e pesquisadora em informação Nelia Del Bianco, da Universidade de Brasília (UnB), A Voz do Brasil cumpre o papel da informação de governo de dar ciência à população de realizações de interesse público.
“Não se presta, portanto, a propaganda, mas à qualificação da informação para pessoas que precisam saber porquê é a trabalho dos impostos que paga direta ou indiretamente.”
Para o professor Luiz Artur Ferraretto, responsável pelo Núcleo de Estudos de Rádio da Universidade Federalista do Rio Grande do Sul (UFRGS), o programa de rádio acaba oferecendo uma opção mais unificada de informação pública, em vista, inclusive, de respeitar espaços para os poderes e partidos políticos com distribuição dos conteúdos de maneira mais equilibrada:
“Eu acho que é muito relevante porque chega a todos os brasileiros e a todas as brasileiras que queiram receber essa informação. Basta sintonizar em determinados horários a emissora de rádio mais próxima de si mesmo”.
A notícia
Também liderança, da comunidade quilombola Armada, José Alex Borges Mendes, de 47 anos, no município de Canguçu (RS), diz que o rádio é um veículo que chega a todos já que há menos o hábito de ler notícias. Ele entende que A Voz do Brasil ajuda a compreender os programas sociais e as leis.
“Acho que é muito importante ter esse mecanismo para poder dar conta de informar essa população que tem uma carência da informação”. Ele acompanha o programa no radinho de rima de vivenda. A comunidade Armada tem 60 famílias.
“A gente espera, ansioso, que consiga ter nossas titulações no nosso território. Mas, pelo outro lado, a gente sabe que tem um conflito entre sociedade social e os grandes empresários para restituir o nosso território”.
Estratégia
Segundo avaliam os pesquisadores, o rádio continua sendo um veículo estratégico para o país, inclusive por ser uma meio de integração e instrumento de informação em dias de desastres, porquê ocorreu no Rio Grande do Sul neste ano. A professora Nélia Del Bianco afirma que a audiência de rádio no país ainda é significativa.
“O interesse por notícias alcança 45% da audiência de rádio”, diz a professora da UnB. Ela cita que, em média, uma pessoa escuta de três a quatro horas de rádio, tempo médio que pode ser superior no interno do país. “Em emergências resiste diante da falta de vontade, porque pode ser ouvido em rádio a pilhas. É o último a permanecer mudo diante da calamidade”.
O professor da UFRGS, Luiz Ferraretto, explica que regiões do seu Estado ficaram sem veículos locais. “Nesse tipo de região, evidencia-se a premência de uma atuação dos poderes públicos. Nesse sentido, A Voz do Brasil se torna muito relevante para essas regiões”.
Pertencimento
As histórias de comunidades fazem lembrar as funções que historicamente A Voz do Brasil cumpriu no interno do País. Uma delas é lembrada pela ministra do Meio Envolvente, Marina Silva.
Ela recorda da imagem do pai seringueiro aguardando o programa inaugurar… Segundo relata, tudo poderia mudar a depender das notícias que seriam trazidas. Ela diz que pelo rádio, as pessoas poderiam entender mais sobre sua comunidade, que está ligado a uma cidade, um estado e um país.
“Tive experiências muito fortes. Eu me lembro que meu pai, quando assumiu o [presidente Emílio] Garrastazu Médici (1969), na estação da ditadura, com o ouvido colado n’A Voz do Brasil (…). Olhou para a minha mãe e disse: não falou zero que vai aumentar o preço da borracha”, recordou a ministra em entrevista à Rádio Pátrio, da EBC, em setembro do ano pretérito.
“Ele ouvia A Voz do Brasil, a BBC, de Londres, e A Rádio Tirana, da Albânia. Tudo porque ele ficava mudando de notícia em notícia”.
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