O retorno do véu sagrado oxigena o debate sobre os direitos dos povos tradicionais no Brasil, principalmente dos povos originários. Oriente caso se torna emblemático no contexto pós-colonial e pode estabelecer um precedente para a solução de outras tensões entre comunidades tradicionais, governos e instituições. A tensão que se instaurou em torno desse artefato, reivindicado pelo povo Tupinambá de Olivença, uma comunidade indígena do interno da Bahia, nos lembra o quanto o colonialismo ainda está presente em nossas vidas.
Os povos tradicionais enfrentam uma forma persistente de tutela por segmento das instituições e do Estado, que frequentemente acreditam saber melhor do que as próprias comunidades porquê cuidar de seus membros e de seus artefatos. Essa visão paternalista desconsidera o conhecimento e a autonomia dos povos tradicionais, assumindo erroneamente que as instituições têm a cultura superior para tomar decisões sobre o que é melhor para esses grupos. Apesar de serem centros importantes de pesquisa e tirocínio, no pretérito colonial, essas instituições muitas vezes foram usadas para fins de dominação. Atualmente, a falta de consideração pelas demandas das comunidades pode resultar na negação de seus direitos, porquê evidenciado pela não consideração do pedido da comunidade para realizar um ritual logo que o véu chegasse ao Brasil, vindo do Museu Vernáculo da Dinamarca, em Copenhague.
Hoje, surgem múltiplas narrativas sobre o véu sagrado. Algumas, oriundas das instituições, afirmam que o véu foi presente de Maurício de Nassau, o governante da colônia holandesa em Pernambuco, aos seus parentes na Europa. Na quadra, os mantos eram considerados peças raríssimas das coleções etnográficas. No entanto, a comunidade Tupinambá conta uma outra história, acreditando que o véu foi roubado.
Essa tensão revela a dinâmica desigual de poder, evidenciando a diferença entre as vozes consideradas “altas” e legítimas e as vozes “baixas”, frequentemente silenciadas. Antes de fazer qualquer especulação sobre roubo ou doação, é importante reconhecer o contexto histórico do vinda colonial. Durante esse período, foram usadas diversas estratégias de sobrevivência e resistência: alguns grupos faziam pactos enquanto outros eram combatidos. O objetivo principal sempre foi a exploração máxima dos recursos e da capacidade laboral das pessoas. Assim, qualquer ação que tenha levado o véu para fora do Brasil reabre uma grande ferida colonial que ele volta a expor, lembrando-nos das tensões não resolvidas pelo Estado brasílio e pelas instituições, porquê as academias. Nesse sentido, aprendemos com a pesquisadora indígena Linda Tuhiwai porquê os espaços de pesquisa muitas vezes evidenciam a exploração dos povos originários e o roubo de suas narrativas, impondo uma história única – a do colonizador. Em suas palavras, “o Poderio reescreve” (The Empire Writes Back), reescrevendo os discursos coloniais sem mudar verdadeiramente as relações de poder, mantendo os povos em uma posição subalterna.
“A vocábulo ‘pesquisa’, em si, é provavelmente uma das mais sujas do vocabulário indígena. Quando mencionada em diversos contextos, provoca silêncio, evoca memórias ruins, desperta um sorriso de conhecimento e de suspicácia. Ela é tão poderosa que os povos indígenas até escrevem poemas a seu saudação. A forma porquê a pesquisa científica esteve implicada nos piores excessos do colonialismo mantém-se porquê uma história lembrada por muitos povos colonizados em todo o mundo. É uma história que ainda fere, no mais profundo sentido, a nossa humanidade”, disse ela em seu livro Descolonizando Metodologias: Pesquisa e Povos Indígenas.
Entre as vozes silenciadas estão as dos anciãos da comunidade Tupinambá, no interno da Bahia, que possuem uma narrativa autóctone sobre o véu. Mesmo em seguida o reconhecimento do véu por Amaltara no início dos anos 2000 e o pedido formal da comunidade para seu retorno, o Museu Vernáculo não consultou a comunidade – que abrange 23 aldeias e diversos caciques – sobre o tramontana desejado do artefato. Embora o Museu tenha realizado reuniões com a comunidade em seguida a ciência do retorno do véu, o libido de realizar um ritual de recepção logo que o artefato chegasse não foi atendido. Esta preterição não somente violou o recta da comunidade de realizar um ritual forçoso para a espiritualidade do véu, mas também afetou os direitos culturais e espirituais da comunidade Tupinambá. A falta de consulta e o desrespeito pelas práticas e direitos tradicionais refletem uma perenidade da tutela colonial.
A questão meão permanece: a quem pertence o véu? À comunidade Tupinambá, de onde ele foi tirado, ou às instituições que alegam buscar sua preservação? O pedido da comunidade é que seja criado um espaço fidedigno de cultura indígena, onde os povos originários possam recontar sua própria história e cuidar de seus artefatos.
A Cacique Valdelice Tupinambá (Jamopoty), uma das principais vozes de resistência do povo, relembra a luta avito e a resiliência da comunidade: “A memória está viva, né? Ela fez a passagem, mas ela deixou a história que nós vamos deixar. Nunca a história de Nivalda (Amaltara) será esquecida, porque ela foi uma vitoriosa. Uma mulher guerreira, vitoriosa, que se levantou. […] Porquê é que o governo brasílio, porquê é que as leis agora dizem que nós não somos legítimos? Que nós não somos indígenas? Eles cortaram todo o tronco, queimaram todo o tronco, queimaram aquela árvore, mas deixaram as raízes e da raiz nós brotamos.”
Valdelice também destaca a preço do retorno do véu Tupinambá porquê segmento da luta pela terreno: “Nós vamos fazer uma novidade história. Vai chegar um Ancião para demarcar nossa Terreno, você sabe por quê? Porque quando ele foi tirado do povo, ele saiu do território Tupinambá, ele enfraqueceu a povoado e hoje ele vem porquê um Ancião para fortalecer essa povoado.
A jornada da comunidade até conseguir rever o Véu Sagrado foi marcada por dificuldades. Mesmo em seguida muitos pedidos de ajuda às instituições e ao governo, foi somente com o escora de algumas figuras que realizaram doações que conseguiram trespassar do interno da Bahia e viajar ao Rio de Janeiro. Durante essa jornada, enfrentaram escassez de recursos, chegando a passar grandes intervalos sem alimento no Rio de Janeiro. Entretanto, a comunidade se manteve firme em suas reivindicações, mesmo diante do cansaço.
No grande dia, a fala emocionada da líder Cacique Valdelice e da anciã Yakuy evocaram a profunda tensão ainda existente sobre onde deveria permanecer o véu e a terreno que precisa ser demarcada. O presidente Lula, presente na cerimônia, manifestou a promessa de calcular a situação da demarcação do território e destacou que espera que as pessoas entendam que o lugar adequado para o véu não é no museu.
Assim, observa-se também em seguida a cerimônia realizada na quinta-feira passada, que o retorno do véu não é somente uma questão simbólica, mas envolve intrinsecamente a luta pela demarcação de terras. Estamos falando de um recta à espiritualidade e também de segurança territorial. A comunidade Tupinambá, que já perdeu mais de 17 lideranças em conflitos territoriais, vive um cenário de violência jacente. Em 2016, um Mandado de Segurança foi julgado no Supremo Tribunal de Justiça, buscando impedir a perenidade da demarcação do território indígena. Em 2019, a EMBRATUR chegou a pedir que a Funai desistisse da demarcação da Terreno Indígena em Ilhéus para permitir a construção de um resort por um grupo português. A instabilidade continuou, e em 2021, o povo Tupinambá denunciou a FUNAI por negligência, ao se recusar a escoltar as ações jurídicas contra despejos.
Por termo, o retorno do Véu, de traje, trouxe um fortalecimento único para o povo Tupinambá, que conseguiu recontar sua história ao mundo a partir de sua própria narrativa. Que o véu logo também possa mostrar para um grande primícias de um caminho descolonial. Não há porquê proceder nos direitos dos povos originários sem adotar uma abordagem verdadeiramente contracolonial, porquê sugerido por Nego Patriarca. A contracolonialidade, porquê ele define, é uma ação concreta que procura desmantelar as estruturas coloniais e entregar a sucursal aos povos tradicionais sobre si mesmos e sua história. Somente por meio de ações efetivas e políticas que respeitem as tradições e direitos dos povos originários, poderemos proceder em direção a uma sociedade mais justa e equitativa.
*Jade Alcântara Lobo é pesquisadora, ativista e escritora baiana, doutoranda em Antropologia Social na UFSC e certificada pelo Afro-Latin American Research Institute at Harvard University. Rabi em Antropologia pela UFBA e graduada pela UNILA, possui experiência em relações étnico-raciais, povos tradicionais e cosmopolíticas afroindígenas. Atua porquê perita judicial, é a autora do livro *”Para Além da Imigração Haitiana: Racismo e Patriarcado porquê Sistema Internacional”*, criadora e editora da *Revista Odù*, e foi coordenadora de pesquisa no IDAFRO.
**Oriente é um cláusula de opinião e não necessariamente expressa a traço editorial do Brasil de Roupa.
Edição: Thalita Pires
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