Fogos de artifício foram lançados da Terreno Indígena (TI) Potiguara de Monte-mor, no setentrião da Paraíba, em 5 de dezembro. Cacica Cal, porquê é chamada Claudecir Braz, neste momento estava em Brasília. Ao lado de outras lideranças indígenas e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), assinou e recebeu o documento de homologação da TI, reivindicado há ao menos quatro décadas pelo seu povo.
“Um sonho esperado por tantos anos, por tantas pessoas que iniciaram esse processo e que hoje já não estão mais entre nós. Em músculos, né, mas em espírito estão. Foi uma alegria inúmero”, comenta cacica Cal, integrante da Fala dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme).
Composta pelas aldeias Monte-mor, Jaraguá, Ibiquara, Lagoa Grande e Três Rios, a TI Potiguara de Monte-mor foi identificada e delimitada pela Instauração Pátrio dos Povos Indígenas (Funai) em 2004. Três anos depois, 400 Potiguara ocuparam a sede da Funai em João Pessoa (PB) e pressionaram pela assinatura da portaria declaratória pelo logo ministro da Justiça, Tarso Genro. Em 2009, foi feita a demarcação física dos 7.530 hectares e, ao longo dos últimos 15 anos, os indígenas aguardaram a canetada da homologação, lanço final do processo demarcatório.
Claudecir Braz, cacica da povoação Monte-mor, durante Toré, ritual sagrado dos Potiguara / Leandro Ramos e Ednalvo Promanação / Comunidade Potiguara de Monte-mor
Aníbal Cordeiro Campos, cacique da povoação Jaraguá, nem estava esperando. “Porque já tinha ido várias vezes a Brasília receber a homologação e não pudemos ser garantidos”, explica. Aníbal foi um dos que se frustrou quando, durante o Acampamento Terreno Livre em abril, o presidente demarcou exclusivamente duas das seis terras esperadas pelo movimento indígena.
“Agora conseguimos”, sorri o cacique, sem desfazer uma sentença preocupada. “Mas o risco de vida que estamos correndo agora… Porque tem que tirar os posseiros de dentro da espaço. Queira ou não queira”, defende. Segundo Campos, há murado de 150 pequenos posseiros brancos exclusivamente em sua povoação.
“A relação é boa, mas quando veio a notícia da terreno homologada, já vieram com outros olhos. Pensaram que nunca ia ser homologada e que nunca iam trespassar do território. E agora têm a certeza de que vão trespassar”, avalia Aníbal.
O Brasil de Indumento questionou o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) mais de uma vez sobre a quantidade de não-indígenas que devem ser retirados da espaço, quando e porquê será feita a desintrusão, mas não teve resposta até o fechamento desta material. Caso venha, o texto será atualizado.
A situação da TI Potiguara de Monte-mor é privado. Localizado nos municípios de Marcação (PB) e Rio Tinto (PB), ao território tem 10.966 habitantes. Quem cruza desavisado a ponte que sai do meio de Rio Tinto para uma espaço mais periférica pode não notar que passou a pisar em território indígena.
Urbanizada, a povoação Monte-mor inclui, em meio a símbolos Potiguara, um galpão de fábrica desativada, casarões e chalés de estética europeia, com tijolos maciços aparentes. São marcas do principal conflito dos indígenas pelo seu território: a cidade foi erguida e dominada pela família sueca Lundgren, que ali instalou a Companhia de Tecidos Rio Tinto e, décadas mais tarde, arrendou terras para usinas de cana de açúcar. São numerosos os não-indígenas que vivem na região.
O domínio da Cia de Tecidos
De contrato com o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) da TI publicado em 1997 há registros de presença Potiguara no litoral paraibano desde o século 17. No prelúdios do século 20, no entanto, os indígenas conheceram os Lundgren.
“Da jaqueira até ali”, aponta Aníbal, “tinham 150 casas de palha. Numa maldita noite a companhia tocou queimação nessas casas. Muitos morreram e muitos correram”. A sua avó, Antônia, era párvulo. “Os pais dela, os irmãos dela, morreram queimados. Minha avó contava”, diz.
Cacique da povoação Jaraguá, Aníbal Cordeiro defende que posseiros sejam indenizados e retirados da TI / Leandro Ramos e Ednalvo Promanação / Comunidade Potiguara de Monte-mor
No lugar da povoação, foi erguida uma vila operária. “Fizeram essas casas e começaram a empregar os índios. Aquele que não queria morrer, ficava para ser empregado da companhia. A terreno não é dela”, contou Vado Ribeiro, vetusto cacique da povoação Monte-mor, em prova oferecido em 2002 à Universidade Federalista da Paraíba (UFPB). Importante liderança Potiguara, Vado morreu dois anos depois a entrevista.
A família sueca, que fundou também as Casas Pernambucanas, instalou a fábrica em 1918. O objetivo foi penetrar o empreendimento “em terras distantes e de difícil aproximação, de modo a evitar interferências externas de cunho solene ou sindical sobre as relações de trabalho e de mando nos seus domínios”, aponta o antropólogo Estêvão Martins Palitot, no cláusula Os Potiguara de Monte-mor e a cidade de Rio Tinto: a mobilização indígena porquê reescrita da história.
O coronel Frederico Lundgren, cuja estátua faz segmento da paisagem de Rio Tinto, representou o ponto sumo da domínio centralizadora da família sobre a população, composta pelos indígenas e os murado de 20 milénio trabalhadores trazidos de outros estados. O coronel “enfeixava todas as relações em torno de si”, escreve Palitot: “Tudo na cidade pertencia à fábrica, do trabalho à moradia, do lazer à religião, pois até as igrejas e os prostíbulos eram propriedade da companhia”.
Na metade da dez de 1970, a Companhia de Tecidos Rio Tinto entrou em crise, demitiu trabalhadores em tamanho e tomou a decisão que faz com que a região seja, até hoje, rodeada de monocultura de cana. Chegam as usinas Agroindústria Camaratuba, do grupo Miriri, Rio Vermelho Agropastoril Mercantil S.A e Japungú. A fábrica têxtil fecha definitivamente nos anos 1990.
Questionado sobre a luta por demarcação, Aníbal opina que “a primeira ação” quem fez foi um indígena sabido por Zé Soares. Em 1983, ele e outros quatro mataram o gestor da herdade Rio Vermelho, da empresa têxtil. “A cia de tecidos ainda estava rodando, a todo vapor mesmo. Mas aconteceu. Foi o primeiro conflito, em Lagoa Grande”, narra Aníbal.
Uma edição de 1989 do jornal O Momento, disponível no montão do Instituto Socioambiental (ISA), noticia que “a vítima foi abatida a golpes de foice, facão, machado e faca-peixeira” e que um policial militar escapou por pouco. A material informa que o juiz transferiu o julgamento dos acusados para João Pessoa (PB), pois em Rio Tinto os jurados se sentiam intimidados pela população indígena.
Jornal O momento diz que indígenas acusados de matar gestor da herdade em 1983 não seriam julgados em Rio Tinto / Montão ISA
É “Seu Vicentinho”, no entanto, o nome citado por indígenas ouvidos pela reportagem porquê “aquele que começou a luta” – ao menos o ciclo mais recente dela. Vicente José da Silva foi cacique da povoação Jaraguá e, em 1985, articulou algumas famílias para iniciar o processo de retomada de suas terras, na estação dominadas pelas usinas de cana.
Do sobranceiro do seu murado de 1 metro e meio de profundeza, Seu Vicente “não abaixava a cabeça para latifundiário, não”, descreve cacique Aníbal. Na estação com 14 anos, Aníbal se juntou ao grupo que se organizou para entrar nas áreas, arrancar os canaviais e fazer roça de mantimentos.
“Seu Vicente chamou a gente para a igreja, para nós se reunir e fazer o planejamento para tomar nossa terreno de volta”, relata Aníbal. No início, a adesão foi pouca, já que o pavor da companhia era muito. Mesmo assim, foram em frente. “Acompanhei desde o prelúdios. Mas vi a vitória, né? Eles não viram, porque Deus chamou, né, mas eu estou cá para descrever a história e ver”, diz Aníbal.
No próximo 27 de dezembro, os Potiguara comemoram a homologação do território com uma sarau em frente à Igreja Nossa Senhora dos Prazeres. Foi ali a primeira reunião para organizar as retomadas que se expandiram ao longo das décadas seguintes.
Em frente à Igreja Nossa Senhora dos Prazeres ocorreu a primeira reunião em 1985 para planejar as retomadas de terreno / Gabriela Moncau
Dona Bilui, porquê é conhecida Maria dos Prazeres Bezerra, tem hoje 63 anos e participou das ocupações de terreno junto com sua mãe, dona Luísa, que foi uma respeitada anciã Potiguara.
“A gente ficava né, porque era uma pendência. A gente não queria perder o lado da gente. A gente ficava de noite, não era só uma pessoa, eram muitas pessoas. Ficava lá vigiando, porque era muito aventuroso né?”, rememora Bilui, gesticulando em uma cadeira de balanço em sua morada, localizada em espaço reconquistada desta forma pelos indígenas.
“Cá mesmo eram as barracas. Lá na mata tinha umas casas da herdade lá que o povo ficava tudo acampado lá”, lembra dona Bilui. “Aí a luta foi crescendo, crescendo. As viagens para Brasília, a gente não sabe nem da soma, porque foram muitas viagens. E zero de trespassar, mas, graças a Deus, agora saiu”, sorri, olhando para cima.
Dona Bilui, indígena Potiguara que participou das retomadas das áreas hoje homologadas / Gabriela Moncau
“Em 2003, a gente ocupou uma espaço maior para inquirir a demarcação da povoação Três Rios e, em 2005, a gente retomou todo esse território que você hoje passa e vê urbanizado, dentro da povoação Monte-mor”, conta a cacica Cal.
Foi também neste período que os indígenas definiram coletivamente parar de remunerar aluguel para a família Lundgren. “As áreas de capoeira que tinha dentro da mata a gente era obrigado a remunerar arrendamento à Cia de Tecidos Rio Tinto. Veja que contraditório: eles invadem nosso território e ainda nos cobram para que possamos trabalhar e tirar nosso sustento”, relata a cacica.
Não sem conflito e ameaças de detrito: a partir da metade da dez de 2000, os indígenas boicotaram o aluguel cobrado para que pudessem estar em sua própria terreno. Os outros moradores da cidade, no entanto, só conseguiram mudar essa requisito em 2022. Há pouco menos de dois anos, o governo da Paraíba desapropriou dos Lundgren, no valor de R$ 23,5 milhões, as residências de 700 famílias de Rio Tinto.
O palacete
A residência dos próprios Lundberg, um palacete de três andares construído nos anos 1930, fica na povoação Jaraguá e está hoje menosprezado. Por terem recebido ali alemães que fugiram da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), boatos de uma suposta simpatia da família ao regime nazista persistem até a atualidade.
O luxuoso palacete abrigou a família Lundgren; hoje os Potiguara planejam transformá-lo em museu / Gabriela Moncau
Se dependesse do cacique Aníbal, o prédio seria destruído. “Esse palacete foi construído em cima das cinzas do nosso povo”, afirma. A intenção da comunidade, no entanto, é fazer do prédio um museu sobre a história indígena da região.
“Todo o terreno em volta onde você viu a cana de açúcar não é mais do quinteiro. Hoje é dos indígenas. Em 2010 nós colocamos para fora do nosso território o último quinteiro que estava instalado cá”, atesta a cacica Cal.
“Hoje, dissemelhante do que os usineiros fizeram, nós plantamos a cana de açúcar. Mas com a responsabilidade de restabelecer toda a espaço que eles ora destruíram. Cada família indígena que tem seu pedaço de cana plantado tem obrigatoriamente que repor 20% da mata ciliar, de mata atlântica”, explica. “A gente teve o retorno das nascentes, da qualidade de vida que tínhamos perdido com a invasão das usinas”, conta Braz.
Vislumbrando os desafios depois a homologação do território, cacique Aníbal pontua que é preciso “se preparar pelo horizonte que queremos deixar para os nossos curumins [criança em tupi-guarani]. Que a terreno nós conseguimos. Agora eles que têm de cuidar dela. Nós já estamos cansados e a qualquer momento Deus pode invocar a gente, né, tem que ter aqueles guerreiros para tomar conta”.
Edição: Martina Medina
