O Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), que mobiliza as vítimas do rompimento da barragem da mineradora Samarco, manifestou indignação diante da perdão de todos os réus da ação que julgava as responsabilidades criminais pelo incidente. A entidade avaliou se tratar de uma canseira a todos os que perderam seus entes queridos.
“Diante de inúmeros indícios da ciência que as empresas criminosas tinham sobre o risco de rompimento da estrutura e a negligência com que trataram o caso – utilizando-se inclusive de laudo ambiental falso – é um disparate o entendimento de que não há nexo causal entre o violação e os indiciados”, registra nota de repúdio divulgada pelo MAB.
A entidade disse estar comprometida com a procura por justiça e afirmou que irá apresentar recursos às instâncias superiores. O Ministério Público Federalista (MPF) também afirmou que irá impugnar a decisão, tomada nesta quinta-feira (14) pelo Tribunal Regional Federalista da 6ª Região (TRF-6), em Belo Horizonte.
O rompimento da barragem, situada no município de Mariana (MG), aconteceu no dia 5 de novembro de 2015. Na ocasião, murado de 39 milhões de metros cúbicos de rejeitos escoaram pela Bacia do Rio Guloseima. Dezenove pessoas morreram e uma mulher que estava prenha, resgatada com vida, sofreu um monstruosidade. Houve impactos para as populações de dezenas de municípios até a foz do Rio Guloseima, no Espírito Santo.
Processo criminal
Ninguém chegou a ser recluso, nem mesmo em caráter preventivo ou temporário. O processo criminal começou a tramitar em 2016 com a denúncia do Ministério Público Federalista (MPF). Inicialmente, eram 22 réus. A Samarco e suas duas acionistas – Vale e BHP Billiton – também eram julgadas e poderiam ser penalizadas pelos crimes ambientais, assim porquê a VogBr, auditoria que assinou o laudo de segurança da barragem que se rompeu.
No entanto, ao longo do tempo, foram concedidos habeas corpus a alguns denunciados. Aliás, houve alguns crimes prescritos e, em 2019, uma decisão judicial beneficiou os réus ao instaurar o trancamento da ação penal para a arguição de homicídio qualificado. Prevaleceu a tese de que os indícios incluídos na denúncia apontavam as mortes porquê consequências do violação de inundação.
A decisão desta quinta-feira (14) absolveu todos os sete réis que ainda figuravam no processo por crimes ambientais, incluindo o ex-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi. Eles não respondiam mais por homicídio, unicamente por crimes ambientais. A sentença também absolveu as três mineradoras e a VogBr.
A juíza Patrícia Alencar Teixeira de Roble, que assina a decisão, pontuou não ter “provas suficientes para estabelecer a responsabilidade criminal”. Em sua visão, a diretoria encarregou profissionais qualificados para as operações das barragens e não foi informada sobre eventos que agravaram os riscos. Aliás, ela considerou não ter sido provado que atos ou omissões levaram ao rompimento da barragem.
Procuradas pela Sucursal Brasil, a Samarco e a Vale não se manifestaram sobre a decisão. A BHP Billiton informou – em nota – que ainda não foi notificada. “Uma vez que uma das acionistas da Samarco, a empresa sempre esteve e continua comprometida com todos os esforços de reparação em curso no Brasil devido ao rompimento da barragem em 2015”, acrescenta a mineradora.
Além do processo criminal, tramitam na esfera cível diversas ações envolvendo a reparação dos danos causados na tragédia. Há três semanas, um novo negócio buscando equacionar essa situação foi assinado entre as mineradoras, o governo federalista, os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, o MPF e outras instituições da Justiça. Até portanto, o processo de reparação vinha sendo orientado com base no Termo de Transação e Ajuste de Conduta (TTAC), firmado em 2016. Nascente primeiro negócio, no entanto, vinha sendo considerado insatisfatório.
O novo negócio foi fruto de três anos de negociações em procura de uma repactuação do processo reparatório que fosse capaz de solucionar um passivo de 80 milénio ações judiciais. Foi definido um aporte de R$ 100 bilhões em numerário novo, sendo feitas modificações substanciais na governança do processo reparatório, afastando a atuação da Instalação Renova, que havia sido criada com base no TTAC.
Mas a forma porquê se desenvolveram as tratativas, sem a participação dos atingidos, é objectivo de críticas do MAB. A entidade também chegou a questionar judicialmente algumas cláusulas.
Justiça inglesa
Paralelamente, o processo reparatório também está em debate na Justiça inglesa, onde mais de 600 milénio atingidos e dezenas de municípios buscam reparação em uma ação contra a BHP Billiton. A mineradora anglo-australiana acionista da Samarco é objectivo do processo porque tem sede em Londres. O escritório Pogust Goodhead, que representa as vítimas, estima que uma pena possa chegar a R$ 260 bilhões, resultando em indenizações mais elevadas do que as previstas no negócio firmado no Brasil. Mas, com a exigência do termo de quitação final, cada atingido poderá ter que fazer uma opção entre receber agora ou esperar o resultado do processo inglês.
Na atual lanço do processo inglês, que deve insistir até março do próximo ano, os juízes irão instaurar se há ou não responsabilidade da anglo-australiana BHP Billiton. A mineradora vem sustentando que o processo duplica questões que já estão sendo equacionadas no Brasil. Há um negócio entre as duas acionistas da Samarco – BHP Billiton e Vale – para que, em caso de pena, cada uma arque com 50% dos valores fixados.
Na nota em que repudiou a perdão dos réus no processo criminal, o MAB também manifestou surpresa com uma decisão favorável às mineradoras sendo publicada logo depois a assinatura do negócio de reparação e em meio ao julgamento do valor no processo inglês.
“Questionamos o verdadeiro propósito dessas recentes e intensas condutas da Justiça brasileira – depois um longo hiato de decisões sobre o caso – frente à tramitação do processo na golpe britânica. Também seguimos confiantes na Justiça inglesa, esperando que, enfim, os criminosos sejam punidos e os atingidos sejam devidamente reparados”, registra o texto.
Remissão dos réus
O escritório Pogust Goodhead, que defende os atingidos no tribunal do país europeu, afirmou, em nota, que não fará comentários sobre a perdão dos réus, uma vez que a questão penal seria uma privilégio do Judiciário brasiliano.
Ao mesmo tempo, manifestou crédito de que o processo inglês irá confirmar a urgência da devida punição à irresponsabilidade corporativa, que custa vidas e traz danos irreparáveis ao meio envolvente.
“A ação em Londres está em curso e tem revelado, dia depois dia, com farta documentação, a completa negligência das empresas envolvidas que culminaram nesta tragédia. A Justiça inglesa vai julgar a responsabilidade social, não criminal, com a devida reparação às vítimas em caso de pena da BHP”, finaliza o escritório.
Léo Rodrigues – Repórter da Sucursal Brasil