Ganhou fôlego, na Câmara dos Deputados, a medida que prevê o termo da jornada de seis dias de trabalho para cada dia de folga, chamada de graduação 6×1. O texto ainda não foi formalmente protocolado porque, por se tratar de uma proposta de emenda constitucional (PEC), precisa de 171 assinaturas de parlamentares para inaugurar a tramitar, mas vem ganhando maior capilaridade entre os grupos políticos. Com novas adesões obtidas nesta terça-feira (12), a lista de signatários subiu para 139.
“Nós vamos procurar [os parlamentares] e dialogar com cada deputado e deputada que ainda não assinou a PEC para que assine até amanhã. E cá eu estou falando de deputados que têm sensibilidade, que têm humanidade. Alguns ainda não assinaram e tem outros que nem adianta [buscar] porque sempre atuaram contra os trabalhadores. Tenho muita fé de que a gente consegue essas assinaturas para protocolar esta PEC ainda esta semana e, a partir disso, [espero] que esta Vivenda possa votar esse tema com rapidez”, disse Guilherme Boulos (Psol-SP), em pronunciamento feito no plenário na noite desta terça (12).
Na Câmara, a PEC é capitaneada pela deputada Erika Hilton (Psol-SP) e partiu do movimento Vida além do trabalho (VAT), iniciado pelo vereador eleito do Rio de Janeiro (RJ) Ricardo Azevedo. O psolista iniciou uma mobilização nas redes sociais que angariou tapume de 1,5 milhão de assinaturas em prol de um requerimento pelo termo da graduação atual de trabalho. O alcance do movimento fez com que a proposta chegasse ao Congresso por meio da PEC, que tem obtido assinaturas de membros de diferentes partidos.
Na lista dos 139 apoiadores, há deputados das siglas Psol, Rede, PT, PCdoB, PDT, PSB, Solidariedade, Podemos, Avante, MDB, PSD, PSDB, União, PP, Republicanos e PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, de quem grupo político ajudou a confirmar um conjunto de medidas antitrabalhistas nos últimos anos. A PEC também já contabiliza críticos. Entre os nomes que rejeitam a proposta estão Nikolas Ferreira (PL-MG), para quem o texto foi “terrivelmente elaborado”, e lideranças da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), grupo que reúne mais de 250 deputados.
“É uma irresponsabilidade. Acabamos de chegar a um meio-termo em relação à desoneração da folha [de pagamento], que voltará a ser cobrada, e aí aparece uma segunda petardo”, criticou o presidente da FPE, Joaquim Passarinho (PL-PE), que nesta terça chegou a manifestar também que a PEC seria “uma petardo para o Congresso”. Políticos que se opõem à PEC também tentaram mobilizar apoiadores nas redes sociais nos últimos dias, quando as menções à proposta ganharam destaque em diferentes plataformas. O principal vista mencionado por essa lado política é o de que a redução da jornada trazia impacto negativo na economia vernáculo.
O deputado Guilherme Boulos reagiu às manifestações. “O argumento de que isso vai lutar as empresas e destruir a economia é o argumento que usavam décadas detrás ou um século detrás, quando se implementou o salário mínimo ou as férias, ou o décimo terceiro. Tudo isso de direitos foi implementado, e não se destruiu a economia. Aliás, a redução da jornada tem sido implementada em vários países do mundo sem redução da produtividade”, disse o psolista, ao declarar ainda que a oposição à PEC é travestida de falta de alinhamento de segmento do Congresso aos anseios populares.
“É muito fácil indicar o dedo e manifestar que quem não quer trabalhar por 6×1 que se demita e procure outro ocupação quando se tem tempo livre com a família, uma vez que todos cá têm. Esse ataque que está sendo feito com palavras nas redes sociais é plangente e só mostra o preconceito, a ‘povofobia’, a irresponsabilidade com os trabalhadores que vários cá têm.”
Teor
O texto da PEC altera o item 7º da Constituição para inserir a previsão de jornada de trabalho de quatro dias por semana no Brasil. O texto estabelece uma “duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e trinta e seis horas semanais, com jornada de trabalho de quatro dias por semana, sendo facultadas a ressarcimento de horários e a redução de jornada, mediante concórdia ou convenção coletiva de trabalho”. Na justificativa da PEC, Erika Hilton afirma que a proposta “reflete um movimento global em direção a modelos de trabalho mais flexíveis aos trabalhadores, reconhecendo a urgência de adaptação às novas realidades do mercado de trabalho e às demandas por melhor qualidade de vida dos trabalhadores e de seus familiares”.
“É de conhecimento universal que a jornada de trabalho no Brasil frequentemente ultrapassa os limites razoáveis, sendo a graduação de trabalho 6×1 uma das principais causas de exaustão física e mental dos trabalhadores. A trouxa horária imposta afeta negativamente a qualidade de vida dos empregados, comprometendo sua saúde, bem-estar e as relações familiares. Em razão desses fatores, deve-se reavaliar as práticas de trabalho que afetam a saúde e o estabilidade entre vida profissional e pessoal”, acrescenta a deputada.
Caso obtenha o número de 171 assinaturas e comece a tramitar, a PEC precisará passar pela Percentagem de Constituição e Justiça (CCJ) e por uma percentagem próprio, à qual caberá a avaliação de préstimo do texto. Na sequência, a proposta precisa ser submetida a dois turnos de votação em plenário, onde são exigidos 308 votos – o equivalente a três quintos da Vivenda – para que siga adiante. Caso receba aval dos deputados nas duas votações, a PEC segue para o Senado. Se for finalmente aprovada por deputados e senadores, a medida deve entrar em vigor dentro de 360 dias em seguida sua promulgação, segundo prevê o texto.
Cenário
A discussão sobre a PEC também chegou a outros redutos da política. No contextura sindical, a Meão Única dos Trabalhadores (CUT) disse, em nota publicada nesta terça (12), que defende o teor da PEC. “Progredir na proposta de redução das jornadas de trabalho sem redução salarial é reconhecer e indicar soluções para problemas históricos gerados pelo capitalismo, visto que as tecnologias sempre eliminaram empregos e a ganância dos capitalistas sempre precarizaram as relações de trabalho”, afirma a entidade.
“Atualmente, os novos arranjos de investimentos já não mobilizam a capacidade produtiva na intensidade em que precisa gerar postos de trabalho, além de dirimir padrões de trabalho tradicionalmente associados às ocupações. A redução das jornadas de trabalho contribui sobretudo no sentido de apresentar uma saída para o problema estrutural de falta de trabalho e postos de trabalhos decentes a toda força de trabalho disponível”, acrescenta o texto.
No contextura do governo Lula, a PEC não conta com um oração unificado. O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB), disse que o ponto ainda não foi foco de debate no contextura da gestão, mas destacou que “a mudança é uma tendência no mundo todo”. De outro lado, o ministro do Trabalho, Luiz Pelágico, afirmou, em nota publicada na segunda (11), que a medida precisaria ser negociada entre trabalhadores e empregadores. “O MTE acredita que essa questão deveria ser tratada em convenção e acordos coletivos entre empresas e empregados. No entanto, a pasta considera que a redução da jornada de 44 horas semanais é plenamente verosímil e saudável, diante de uma decisão coletiva”, disse, sem enunciar um posicionamento mais direto em prol da medida.
Edição: Thalita Pires