O Observatório da Indústria da Desinformação e Violência de Gênero nas Plataformas Digitais, criado por uma parceria entre o NetLab-UFRJ e o Ministério das Mulheres, divulgou, nesta sexta-feira (13), uma pesquisa inédita que sobre discursos misóginos em canais do YouTube no Brasil.
Em coletiva de prelo em Brasília, a ministra da pasta, Cida Gonçalves, destacou a prestígio das informações colhidas no estudo para a elaboração de políticas públicas para coibir os conteúdos de caráter misógino, e defendeu a tipificação do delito de ódio contra as mulheres.
“A gente tem que principiar, a partir desses dados, um aprofundamento e, na minha avaliação, sobre a tipificação, porque é a melhor forma que nós temos de coibir”, defendeu. “Até agora, a gente não tinha os dados, você não faz política pública sem dados, sem informação e sem pesquisa. Portanto agora nós temos um oferecido que pode fazer com que, no mínimo, a gente faça um debate pátrio sobre essas questões”, declarou Gonçalves.
O relatório Aprenda a evitar ‘leste tipo’’de mulher: estratégias discursivas e monetização da misoginia no YouTube analisou 76,3 milénio vídeos de uma rede de influenciadores e comunidades digitais da chamada “machosfera”, que chegou ao número de 137 canais com conteúdos explicitamente misógino, com uma média de 152 milénio inscritos em cada um deles. De conformidade com o estudo, os vídeos analisados somam 3,9 bilhões de visualizações e 23 milhões de comentários.
Segundo o relatório, 88% dos vídeos foram publicados nos últimos três anos, demonstrando uma tendência de prolongamento desse tipo de teor, que são direcionados, sobretudo, às militantes feministas, mães solteiras e mulheres com mais de 30 anos. O tema “desprezo às mulheres e insurgência masculina” foi o mais recorrente, presente em 42% dos títulos dos vídeos analisados.
Presente na apresentação dos dados, a ministra da Paridade Racial, Anielle Franco, se disse impactada, ao mesmo que celebrou a realização do estudo. Segundo ela, o material dá subsídios para que políticas públicas possam ser pensadas para enfrentar essa veras.
“Eu estou impactada, em choque, porque uma coisa é a gente mourejar com isso no nosso dia a dia, sem ter a dimensão do tamanho, da profundidade desses dados e dessa crueldade. Parabéns pelo trabalho e eu encerro dizendo da prestígio da coleta de dados e do letramento. Quando a gente fala de letramento, não estou falando só do letramento racial que a gente fala tanto, mas o letrar de dados. Olha uma vez que que ter aproximação a dados e a informação podem mudar as coisas”, disse a ministra.
Eles lucram com o ódio às mulheres
Além de propagar o ódio às mulheres e sua subjugação à superioridade masculina, o estudo identificou que 80% dos canais misóginos utilizam estratégias de monetização “uma vez que anúncios, Super Chat, doações e vendas de produtos”. De conformidade com as informações obtidas 52% dos canais misóginos possuem pelo menos um vídeo com proclamação, e oito deles somaram R$ 68 milénio em arrecadações de 257 transmissões em Super Chat. Outros 28% dos canais disponibilizam links para plataformas de financiamento coletivo.
Ainda segundo o relatório, há anúncios de consultoria individuais para o “desenvolvimento pessoal masculino” em que alguns desses influenciadores cobram até R$ 1 milénio por esse serviço.
Marie Santini, fundadora e coordenadora do NetLab-UFRJ, destacou a imoralidade do mercado criado a partir da monetização desses conteúdos. “O que eu acho que é importante e que a gente está vendo cá, que eu acho que é grave, é a misoginia se tornar um mercado, a misoginia se tornar um negócio, é lucrar moeda com isso. E isso que eu acho que é o ponto principal que a gente está colocando cá”, declarou a pesquisadora, que criticou o aproximação a informações e dados para pesquisa no Brasil.
“O primeiro ponto é que nós temos pouco aproximação a dados. O segundo ponto é que as plataformas dizem nos seus termos de uso que não permitem esse tipo de teor, mas, na prática, a gente está vendo que esses conteúdos florescem, e não só florescem, uma vez que são monetizados”, destacou Santini.
Segundo o ministério, “o objetivo da pesquisa é traçar um quadro do ecossistema misógino na plataforma, de modo a contribuir com as políticas públicas de combate ao ódio e à violência de gênero na internet e fora dela”.
Embora o relatório não correlacione diretamente a circulação dos discursos misóginos e o aumento da violência contra as mulheres, o Ministério da Mulher destaca que nos últimos três anos se observa um prolongamento da quantidade de vídeos com teor misógino e também um aumento de quase 10% dos registros de mortes em função de gênero. Os feminicídios saltaram de 1.347 em 2021 para 1.463 em 2024.
Diante dos dados, a ministra Cida Gonçalves se comprometeu em intensificar o debate internamente no governo, muito uma vez que os demais poderes da República, no sentido de prometer uma maior regulação dos conteúdos disponibilizados pelas plataformas digitais. “Pretendemos fazer um diálogo com o parlamento, fortalecer o debate que está tendo no STF para a questão do da regulamentação. Nós precisamos regular ao supremo o exposição de ódio. E, por outro lado, nós também precisamos fazer um debate com a sociedade brasileira, nós precisamos fazer com que outros atores que não estão no debate do enfrentamento da violência contra as mulheres, não estão enfrentando a misoginia, ou nem percebe o que está acontecendo, estejam do nosso lado”, afirmou.
STF discute responsabilidade das plataformas
O Supremo Tribunal Federalista deve retomar na próxima semana o julgamento sobre a constitucionalidade do item 19 do Marco Social da Internet de 2014, que trata da responsabilidade das plataformas digitais por conteúdos publicados por seus usuários. Em sessão na última quarta-feira (11), o ministro Luiz Fux se somou ao relator do processo, Dias Toffoli, favorável à responsabilização social das redes sociais pelos conteúdos ilegais postados por usuários, uma vez que ataques à democracia, racismo, pedofilia, incitação à violência, entre outros.
Se o entendimento for majoritário, as plataformas serão obrigadas a retirar imediatamente conteúdos ilegais, sem a urgência de um recurso jurídico. Os representantes empresas Google e Meta, que são segmento da ação no STF, defendem que seja mantida a responsabilidade unicamente depois o perfil ser notificado de uma decisão judicial e alegam que o monitoramento do teor fere o princípio da liberdade de sentença.
A pesquisadora do NetLab-UFRJ, Marie Santini afirma que há uma distorção no debate. “A gente está discutindo nesse momento no STF a possibilidade de uma notificação extrajudicial e a possibilidade de que essa plataforma seja obrigada a determinar e tomar uma decisão, e a partir de logo, que ela seja responsável pela decisão que ela tomou. É muito dissemelhante de a gente generalizar cá e proferir que plataformas vão moderar conteúdos aleatoriamente ao seu bel prazer, que as plataformas vão ter que se responsabilizar absolutamente tudo o que acontece, não é isso. Portanto tem muita distorção nesse debate”, avalia.
Durante a coletiva de prelo desta sexta, o secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Informação Social (Secom) da Presidência da República, João Brant, afirmou que o governo tem posição clara sobre a urgência de regulação dessas plataformas.
“A AGU [Advocacia-Geral da União] se posicionou, em nome do governo federalista, cobrando responsabilidade objetiva das plataformas no caso de conteúdos Ilegais ilícitos, e uma ação de obrigação, de prevenção e prevenção, também para conteúdos danosos. Ou seja, tem coisas que não estão hoje tipificadas, mas que causam muitos prejuízos ao recta das mulheres e do conjunto da população brasileira. Portanto o governo tem trabalhado no contexto do Legislativo do Judiciário para fazer prosseguir as possibilidades de regulação”, disse Brant.
A empresa Google, proprietária da plataforma YouTube, não respondeu aos questionamentos da reportagem. O espaço segue acessível para manifestações.
Edição: Thalita Pires