Veja a missiva de Adriano na íntegra
Você sabe o que é ser uma promessa?
Eu sei.
Inclusive uma promessa não cumprida.
O maior desperdício do futebol: Eu.
Sabor dessa termo, desperdício.
Não só por ser músico, mas porque me amarro em desperdiçar a vida. Estou muito assim, em desperdício frenético. Limitado essa pecha.
Mas nunca amarrei uma mulher a uma árvore, porquê dizem.
Não uso drogas, porquê tentam provar.
Não sou do delito, mas, simples, poderia ter sido.
Não limitado baladas.
Vou sempre ao mesmo lugar, o quiosque do Naná, se quiser me encontrar, dá uma passada lá.
Eu bebo todos os dias sim, e os dias não muitas vezes também.
Por que uma pessoa porquê eu chega ao ponto de ingerir quase todos os dias?
Não paladar de dar satisfação para os outros. Mas cá vai uma.
Porque não é fácil ser uma promessa que ficou em dívida. Ainda mais na minha idade.
Me chamam de Imperador.
Imagina isso.
Um rostro que saiu lá da favela para lucrar o sobrenome de Imperador na Europa. Quem explica, rostro? Eu não entendi até hoje. Talvez eu não tenha feito tanta coisa errada assim, não é?
Muita gente não sacou porque abandonei a glória dos gramados pra permanecer cá sentado bebendo em aparente deriva.
Porque em qualquer momento eu quis, e é o tipo de decisão difícil de voltar detrás.
Mas não quero falar disso agora. Quero que você me acompanhe em um rolé de cria.
Eu moro na Barra da Tijuca há muitos anos. Mas o meu umbigo está enterrado na favela.
Vila Cruzeiro. Multíplice da Penha.
Sobe na garupa também. Vamo de moto. É mal eu me sinto à vontade.
Vou avisar que tamo brotando na dimensão. Hoje tu vai entender o que o Adriano realmente faz quando está com os seus parceiros em um lugar muito próprio. Sem folclore ou manchete mentirosa de jornal. A real. À vera.
Anda, rostro. Já tá amanhecendo. Daqui a pouco o trânsito vai estar todo parado. Tu não sabia, não? Daqui até a Penha pela Risca Amarela é rápido, poxa vida. Mas só se for nesse horário.
Partiu?
É mermo. Muito na ingressão da comunidade. O campo do Ordem e Progresso. Porra, eu joguei mais futebol cá do que no San Siro. Papo reto, neguinho.
Repara que pra entrar e pra trespassar da Vila Cruzeiro tem que passar na frente do campo. O futebol se impõe na nossa vida.
Cá meu pai era feliz de verdade. Almir Leite Ribeiro. Pode chamá-lo de Mirinho, ele era publicado assim por todo mundo. Um rostro de noção cume. Tô mentindo? Pergunta pra qualquer um.
No sábado ele acordava cedo, preparava a mochilinha dele e já queria descer logo pro campo. “Bora, xará. To te esperando. Vamo que hoje o jogo vai ser pegado”, ele dizia. O nosso time de várzea se labareda Hang. Por que esse nome? Sei lá, merda. Quando eu conheci já era assim. Joguei durante muito tempo com a camisa amarela e azul. Pode crer. Igual a do Parma. Mesmo depois de ter ido pra Europa eu não abandonei a várzea.
Simples. Eu vinha de férias da Itália e não fazia outra coisa. Pegava o táxi do aeroporto e já mandava tocar direto cá pro Cruzeiro. Puta merda. Não passava nem na mansão da minha mãe antes.
Descia na ingressão do morro, largava as malas e subia gritando. Ia desancar na mansão do falecido Cachaça, meu grande colega, e do Hermes, outro parceiro de puerícia. Chegava esmurrando a janela “acorda, safado! Bora! Bora!”. O Jorginho, meu outro grande colega de puerícia, se juntava e aí, esqueça tudo. Essa rapaziada pintava o sete com catorze. Só encontravam a gente dias depois. Rodávamos o multíplice todo jogando globo, na resenha, de birosca em birosca. Nem cavalo aguenta!
Um dos grandes clássicos do Hang era contra o Placa Quente. Jogamos até final de várzea contra eles. Eu já estava no Parma. Meu pai me falava todo dia. “Já te inscrevi no campeonato, xará. Os caras tão se tremendo. Eu tô há um mês avisando eles ‘meu negão tá chegando’. E eles respondem: ‘não vale, não, Mirinho’. Não tô nem aí. Tu vai jogar.”
Joguei mermo.
Com um copinho de Coca-Cola na mão, meu pai anunciou os onze titulares do Hang.
“Hangrismar no gol.
Boldo com Limão, Richard e Cachaça na zaga.”
Porra, Boldo com Limão era um rostro amargo. Reclamava de tudo. O Richard tinha um chuto que era tão potente — ou mais até — que o meu. Neguinho se tremia todo de permanecer na barreira quando ele ia pra cobrança.
“Hermes na volância junto com o Alan.
Crézio na ponta direita e Jorginho na esquerda, nosso camisa sete.
No ataque Frank, Dingo, o possuidor da camisa 10, e Adriano.”
Dava pra jogar Champions League com esse time aí.
Calorão do Rio, típico de término de ano. Música subida. Sambão. Cada morena andando pra cima e pra insignificante que eu vou te falar… Papai do firmamento abençoe! Não tem zero melhor no planeta, negão.
Batemos campeões. Rojo na favela toda. Um foguetório bonito à pampa.
Foi nesse campo também que eu aprendi a ingerir. Meu pai ficava maluco, rostro. Ele não gostava de ver ninguém tomando uma, muito menos a molecada.
Me lembro da primeira vez que me pegou com um copo na mão. Eu tinha 14 anos e a favela estava em sarau. Era a estreia do refletor no campo do Ordem e Progresso e por isso armaram um futebol com churrasco.
Tinha gente à beça, aquela alegria tomando conta, típica da várzea, tá ligado? Pagode estralando, gente pra lá e pra cá. Eu ainda não era de ingerir. Mas quando vi a rapaziada toda tomando um negócio, rindo, eu falei: “aaaahhhh”. Não teve porquê, peguei um copo de plástico e enchi de cerveja. Aquela espuma amarga e ralinha descendo pela primeira vez teve um sabor próprio. Um mundo novo de “diversão” se abria à minha frente. Minha mãe estava na sarau e viu a cena. Ficou quieta, né? Já o meu pai… Puta que pariu. Quando me viu com o copo na mão, atravessou o campo naquele passo apressado de quem não pode perder o ônibus. “Pode parar”, ele disparou. Limitado e grosso, porquê de uso. Eu falei :“ah, pô”. Minhas tias e minha mãe sacaram logo o movimento e tentaram sossegar antes que a situação ficasse pior. “Poxa, Mirinho, ele tá com os amiguinhos dele, não vai fazer zero demais, tão ali rindo, brincando, deixa eles, o Adriano também já tá crescendo”, disse a minha mãe.
Não teve conversa.
O velho ficou louco. Arrancou o copo da minha mão e jogou fora na sarjeta mesmo. “Eu não te ensinei isso, xará”, ele disse.
O Mirinho era um líder da Vila Cruzeiro. Todo mundo respeitava. E ele dava o exemplo. Futebol era com ele. Uma das missões do Mirinho era evitar que a molecada se envolvesse com o que não devia. Ele tentava sempre trazer as crianças pra globo. Não queria ninguém de bobeira. Muito menos vacilando na escola. O pai dele bebia muito. Esse, sim, era alcoólico. Morreu disso, inclusive. Portanto, toda vez que via a molecada tomando uma, meu pai não tinha incerteza. Lançava copos e garrafas que estavam pela frente no pavimento. Mas não adiantava, né? Portanto, a fera mudou de tática. Quando a gente se distraía, ele arrancava a dentadura e colocava no meu copo, ou no dos meninos que estavam comigo. O rostro era danado. Que saudades dele…
Todas as lições que aprendi com meu pai foram assim, nos gestos. Não tínhamos conversas profundas. O velho não era de filosofar nem de permanecer dando prelecção de moral, não. A retidão no dia a dia e o saudação que os outros tinham por ele era o que mais me impressionava.
A morte do meu pai mudou a minha vida pra sempre. Até hoje é um ponto que ainda não consegui resolver. E pra tu ver porquê são as coisas, a merda toda começou cá, na comunidade que eu considero tanto.
A Vila Cruzeiro não é o melhor lugar do mundo. Muito pelo contrário.
É perigoso pra caramba. A vida é dura. As pessoas sofrem. Muitos amigos precisam seguir outros caminhos. Olha pro lado que tu percebe. Se eu for parar pra descrever todos os conhecidos que já se foram, a gente vai permanecer cá falando por dias e dias… Que papai do firmamento os abençoe. Pode perguntar pra qualquer um cá. Quem tem a oportunidade acaba indo morar em outro lugar.
Porra, meu pai tomou um tiro na cabeça em uma sarau no Cruzeiro. Projéctil perdida. Ele não tinha zero a ver com a confusão. A projéctil entrou pela testa e ficou alojada na nuca dele. Os médicos não tinham porquê remover. Depois disso, a vida da minha família nunca mais foi a mesma. Meu pai passou a ter convulsões frequentes.
Tu já viu uma pessoa sofrendo um ataque epiléptico na tua frente? Ah, logo não queira ver, negão.
É tremendo.
Eu tinha 10 anos quando meu pai foi baleado. Cresci convivendo com as crises dele. O Mirinho nunca mais conseguiu trabalhar. A responsabilidade de sustentar a mansão caiu toda nas costas da minha mãe. E o que ela fez? Se virou. Contou com a ajuda dos vizinhos. A família representou. Cá todo mundo vive com pouco. Ninguém tem zero sobrando. E mesmo assim, minha mãe não ficou sozinha. Sempre tinha alguém dando uma força pra ela.
Um vizinho apareceu com uma caixa grande de ovos, patente dia, e falou: “Rosilda, vende para levantar um trocado. Assim você consegue comprar um lanche para o Adriano”. Só que ela não tinha moeda para remunerar o vizinho. “Não se preocupa, mana. Vende os ovos e depois você me paga.” Era assim, rostro. Te renda.
Outro vizinho arrumou um bujão de gás pra ela. “Rosilda, vende esse cá. Metade é seu, metade é meu.” E lá ia a minha mãe tentar descolar mais um trocado trabalhando duro todo dia. Meu pai ficava em mansão. E minha mãe correndo por dois, enquanto minha avó me levava para os treinos.
Uma das minhas tias conseguiu um trampo fichada e que dava tíquete-refeição. Ela entregava os papeizinhos para a minha mãe. “Rosilda, é pouco, mas dá para pelo menos comprar um biscoito pro Adriano.”
Sem essas pessoas eu não seria zero.
Zero.
Porra, essa falação me deu uma sede danada. Bora recostar ali na birosca do meu colega Hermes. Isso, detrás da quadra. É! Ali no beco.
Minha avó morava cá. Dona Vanda, que figura. Já te falei né? “Adi-ra-no, meu fruto! Vem manducar pipoca.” Vovó não consegue falar meu nome recta até hoje.
Eu ficava na mansão dela todos os dias quando era párvulo. Minha mãe, meu pai e eu morávamos na Rua 9, que fica em cima do morro. Tu quer ir lá ver? Complicado. Tem muita atividade acontecendo. Melhor a gente permanecer cá embaixo mesmo. A favela tem certas regras que a gente precisa respeitar.
Quando eu era párvulo, minha mãe descia para trabalhar e me deixava com a vovó. Ela me levava pra escola e depois para o Flamengo. Minha correria começou cedo, não tem porquê negar.
Hermes, meu cumpade! Puxa aí o dominó pra gente. Desvelo, ele rouba pra caramba. Não cai pra grupo, não. O Hermes é malandro. Senta cá, Jorginho. Gabão de sena sai.
A gente tomava banho num poço que tem ali no final do beco. Piscina na favela é assim, rostro. Tu não sabia, não? Porra, se faz calor na zona sul, onde moram as pessoas que tem mais quesito cá no Rio, imagina na comunidade da zona setentrião… A molecada puxa o balde e se refresca porquê dá. Vou te falar que até hoje eu prefiro isso, sabia? Eu só entro na piscina, no mar, essas coisas, pra tirar vaga mesmo. Mas fico feliz de verdade tomando uma chuveirada na laje, ou quando viro um balde d’chuva na cabeça.
Tu tá vendo o movimento de gente por cá? E o fragor? Porra, a favela é muito dissemelhante. A gente abre a porta de mansão e já encontra a vizinha. Coloca o pé pra fora e tem o possuidor da vendinha na rua, a tia do pastel com uma sacola na mão, o primo do fígaro chamando pra jogar futebol. Todo mundo se conhece. Simples, uma mansão colada na outra, não é mesmo?
Isso foi uma das coisas que eu mais estranhei quando mudei para a Europa. As ruas são silenciosas. As pessoas não se cumprimentam. Cada um na sua. O primeiro Natal que eu passei em Milão foi pesado pra mim, rostro.
O término de ano é uma estação muito importante lá em mansão. Junta todo mundo. Sempre foi assim. A Rua 9 ficava lotada porque o Mirinho era o rostro, né? A tradição começava ali. Na viradela do ano também, era a favela reunida na porta da minha mansão.
Quando fui para a Inter senti um baque muito possante no primeiro inverno. Chegou o Natal e eu fiquei no meu apartamento sozinho. Um insensível do moca em Milão. Aquela depressão que bate nos meses gelados no setentrião da Itália. Todo mundo de roupa escura. As ruas desertas. Os dias são muito curtos. O tempo é molhado. Não dá vontade de fazer zero, rostro. Juntou tudo isso com a saudade de mansão e eu fiquei mal pra caramba.
O Seedorf ainda foi parceiro demais. Ele e a esposa fizeram uma ceia para os mais chegados e me convidaram. Pô, o negrão tem um baita nível. Imagina a recepção de Natal na mansão dele. Uma elegância que só vendo. Estava tudo muito bonito e gostoso, mas a verdade é que eu queria estar no Rio de Janeiro.
Nem fiquei muito com eles. Pedi desculpas, me despedi rápido e voltei para o meu apartamento. Liguei em mansão. “Oi, mãe. Feliz Natal”, eu disse. “Meu fruto! Que saudade. Feliz Natal. Está todo mundo cá, só falta você”, ela respondeu.
Dava pra ouvir as risadas de fundo. O som cume com o batidão que as minhas tias colocam pra lembrar do tempo que elas eram garotas. O quê? Aquelas lá dançam porquê se estivessem no dança até hoje. Minha mãe também é a mesma coisa. Eu via a cena na minha frente só de escutar o fragor pelo telefone. Porra, comecei a chorar na hora.
“Tá tudo muito, meu fruto?”, minha mãe perguntou. “Está, sim. Eu acabei de voltar da mansão de um colega”, contei. “Ah, logo você já jantou? Cá a mamãe ainda está arrumando a mesa”, ela falou, “vai ter até pastel hoje”. Porra, aí era golpe insignificante. O pastel da vovó é o melhor do mundo. Chorei mermo. À pampa.
Eu estava mal. Peguei uma garrafa de vodka. Sem excesso. Tomei aquela porra inteira sozinho. Enchi o cu de vodka. Chorei a noite toda. Apaguei no sofá de tanto que eu bebi e chorei. Mas era isso, né, rostro. O que eu poderia fazer? Eu estava em Milão por um motivo. Era o que eu tinha sonhado a vida inteira. Deus tinha me oferecido a oportunidade de virar jogador de futebol na Europa. A vida da minha família melhorou muito graças ao meu suor e tudo que Ele fez por mim. E que eles também fizeram. Aquele era um preço pequeno até que eu tinha que remunerar, comparado ao que estava acontecendo e que ainda iria intercorrer. Eu tinha essa noção. Mas nem por isso deixei de permanecer triste.
Bora subir na laje do Tota? Lá é o meu refúgio. Vou invocar as motos. A gente leva o nosso danone e eu mostro a vista do multíplice todo. Anda, rostro!
Deixa eu vincular o tutufi. Tutufi, porra. Tu não tá entendendo, não? Pra conectar o celular na caixa de som, merda. Ah, eu não sei falar essas palavras em inglês, não, poxa vida. Eu só estudei até a sétima série, caramba. Na favela a gente tem que colocar no volume cume, rostro. Cá só se ouve música assim.
Ali é a Grota, lá é a Chatuba, cá é o Cruzeiro. É tudo a mesma coisa, na verdade. Uma colada na outra. Mas são comunidades diferentes do multíplice da Penha. E aquela ali é a Igreja da Penha, muito no cume, abençoando todos nós. Isso, eu ando com a igreja pendurada no meu pescoço nesse medalhão cá. Curtiu? Coloca logo pra tirar vaga. Estou te batizando na nossa comunidade. Que moral, hein?
Quando eu “fugi” da Inter e abandonei a Itália, eu vim me esconder cá. Rodei o multíplice inteiro por três dias. Ninguém me encontrou. Não tem porquê. Lei número um da favela. Ponta mudo. Tu acha que alguém iria me xisnovar? A prensa italiana ficou maluca. A polícia do Rio fez até operação para me “resgatar”. Falaram que eu tinha sido sequestrado. Tá de sacanagem, né? Imagina que alguém vai fazer mal pra mim cá, logo eu que sou cria da favela. Nego me recriminou pra caramba.
Querendo ou não, era a independência que eu precisava. Não aguentava mais trespassar na Itália e ter que permanecer olhando pra um lado e pro outro pra saber onde estavam as câmeras, quem se aproximava, se era repórter, pilantra, golpista ou a puta que o pariu.
Na minha comunidade não tem isso. Quando eu tô cá, ninguém de fora sabe o que eu tô fazendo. Esse foi o problema deles. Não entendiam o porquê eu fui pra favela. Não foi por desculpa de bebida, nem de mulher, muito menos por droga. Foi por liberdade. Foi porque eu queria tranquilidade. Eu queria viver. Eu queria ser humano de novo. Só um cadinho. Porra, essa é verdade. E aí?
Tentei fazer o que eles queriam. Barganhei com o Roberto Mancini. Me esforcei com o José Mourinho. Chorei no ombro do Moratti. Mas não consegui fazer o que eles pediam. Eu ficava algumas semanas muito, evitava o danone, treinava feito um cavalo, mas sempre rolava uma recaída. E todo mundo me detonava. Eu não aguentava mais.
Nego falou merda pra caralho porque é tudo constrangido. “Pô, o Adriano parou de lucrar sete milhões de euros. Ele largou tudo por desculpa dessa merda?”, foi o que eu mais ouvi. Mas nego não sabe porque eu fiz isso. Porque eu não estava muito. Eu precisava do meu espaço, fazer o que eu quisesse fazer.
Tu tá vendo agora. Tem um pouco demais acontecendo no nosso rolé? Não. Desculpa decepcionar quem quer que seja. Mas a única coisa que eu busco na Vila Cruzeiro é sossego. Cá eu ando descalço e sem camisa, só de bermudão. Jogo dominó, sento no meio-fio, lembro minhas histórias da puerícia, ouço música, danço com os meus amigos, durmo no pavimento. Vejo o meu pai em cada uma dessas vielas.
O que mais eu vou querer?
Nem mulher eu trago pra cá. Muito menos mexo com as garotas que são da comunidade. Porque eu só quero permanecer tranquilo e lembrar da minha origem.
Zero outrossim.
Eu faço o que eu quero.
Quer vir, vem.
É por isso que eu volto sempre.
Cá sou respeitado de verdade.
Cá está a minha história.
Cá eu aprendi o que é comunidade.
A Vila Cruzeiro não é o melhor lugar do mundo.
A Vila Cruzeiro é o meu lugar.