Há tapume de 3 anos, o cultivador Domingos Rodrigues da Silva precisou terebrar mão da sua geração de abelhas. Com o progressão do desmatamento, o espaço de mata onde ele mantinha a geração ficou cada vez mais reduzido, inviabilizando a atividade.
Domingos mora desde 1968 na Barra do Aroeira, que fica no Tocantins e foi o território quilombola mais desmatado do Brasil em 2023, segundo dados da plataforma Mapbiomas. As terras estão na região do Matopiba, espaço do Condensado onde há intensa expansão agrícola, entre os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
Somente no ano pretérito, a comunidade perdeu 2.555 hectares de mata, um aumento de mais de 600% com relação ao ano anterior.
“Na cabeceira do riacho tá tudo desmatado”, conta o cultivador. Com a derrubada da mata perto da nascente, o riacho assoreou, prejudicando as lavouras da comunidade, onde vivem tapume de 150 famílias. Por lá, os moradores plantam arroz, feijoeiro, mandioca e outros víveres. “De tudo um pouco, para o consumo”, uma vez que explica Domingos.
“Falar do Condensado é uma vez que falar de nós. Porque a maioria do nosso modo de vida vem de estar e viver num envolvente uma vez que esse”, diz a quilombola Rita Lopes. Ela é presidente da Associação do Território Quilombola Rio Preto, espaço vizinha à Barra do Aroeira, onde os moradores também sentem os impactos da devastação. A ruína do bioma tem secado veredas – pequenos rios que correm entre buritizais – e impactado a biodiversidade. “A derrubada das árvores está sumindo com as abelhas, que também fazem secção do bioma e da alimento dos quilombolas. Não só na secção de víveres, mas também medicinal”, conta. No entorno desses territórios tradicionais, avançam as monoculturas de soja, milho e gergelim.
As duas comunidades aguardam a titulação, procedimento que garante a segurança jurídica dos moradores, concedendo o título coletivo da terreno e permitindo a preservação da espaço. Atualmente, no Tocantins, somente o quilombo Ilhéu de São Vicente, em Araguatins, tem a espaço toda titulada.
A primeira lanço do processo de regularização territorial da Barra do Aroeira, o relatório antropológico, foi concluída em 2008. Em 2011, foi concluído e publicado o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID). Em 2021, os moradores receberam o título coletivo de uma porção de milénio hectares do território.
No Território Quilombola Rio Preto, um dos elementos que atesta a presença dos maiores dos moradores na espaço é o Cemitério Campo Santo do Bom Jardim, reconhecido uma vez que sítio arqueológico histórico pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Pátrio (Iphan) em 2023. Entre árvores nativas, estão os túmulos centenários da comunidade, formando uma pequena ilhota de mata em meio à devastação.
Território indígena
Em 2023, o Território Indígena Porquinhos dos Canela-Apãnjekra, no Maranhão, perdeu 2.750 hectares de mata, ficando no topo da lista de territórios indígenas mais desmatados do Brasil. “Foram dois lugares da TI desmatados a partir de 2011, 2012, por aí, até agora e que formaram duas grandes fazendas hoje dominadas pela lavra”, explica Ane Alencar, diretora de ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e coordenadora da equipe Condensado do MapBiomas. O território tem espaço delimitada, mas ainda não foi homologado. A homologação é a lanço final do processo de demarcação de terras indígenas.
Ao todo, foram perdidos 7.048 hectares de vegetação nativa em territórios indígenas no Condensado em 2023, um aumento de 188% em relação a 2022, segundo dados do Mapbiomas. Em todo o Brasil, ao contrário, houve queda no desmatamento em TIs.
Edição: Thalita Pires
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