Na esteira do acirramento das disputas políticas dos últimos tempos, o Brasil foi palco de pelo menos 299 casos de violência política entre 1º de novembro de 2022 e 15 de agosto deste ano. Foram 145 exclusivamente em 2024, com destaque para 14 casos de assassinatos, o ponto eminente desse tipo de ocorrência. Os dados são de um estudo desenvolvido pelas organizações Terreno de Direitos e Justiça Global, que identificaram ainda um salto de 130% nos episódios de violência política no período pré-eleitoral deste ano, cuja largada se deu oficialmente em 16 de agosto, no comparativo com o pleito de 2020.
A pesquisa contabilizou casos de violência manifestados em forma de agressões físicas, ameaças, atentados, invasões, ofensas, criminalização e assassinatos. Observados em retrospectiva, os dados apontam não só para uma crescente dos casos, mas também para uma frequência cada vez maior dessa modalidade de violência no país: no pleito de 2018, uma pessoa foi vítima de violência política a cada oito dias; em 2020, o estudo mostra um caso a cada sete dias; agora, em 2024, a regularidade tem sido de uma vítima de violência política a cada um dia e meio.
Os casos mais comuns foram os de ameaças, com 153 registros, e atentados, com 41. O número totalidade de 299 episódios de violência política entre 2022 e agosto de 2024 teve a seguinte distribuição: foram 22 assassinatos, 26 agressões, 153 ameaças, 41 atentados, 15 criminalizações, 38 ofensas e 4 invasões.
Segundo as organizações, 77% dos ataques foram dirigidos a vítimas que exercem mandatos políticos. Ou por outra, o segmento da esquerda concentrou a maior segmento das ocorrências. PT e Psol foram níveo de 56 e 33 ataques.
Os pesquisadores acompanham o fenômeno da violência política desde 1º de janeiro de 2016 e, de lá até cá, identificaram um montante de 1.168 ocorrências no Brasil.
“Quando a gente começou a observar o problema, em 2016, a gente tinha uma incidência maior de violência concentrada em partidos mais no campo da direita ou do meio. Nos últimos anos, a gente vê que ela está mais concentrada naqueles partidos que se colocam à esquerda. Se a gente pensa no envolvente eleitoral marcado pelo exposição de ódio e violência gerado pelo Jair Bolsonaro (PL), por exemplo, a gente vê [agora] que aquele cenário não sofreu tanta modificação. Ao contrário, [o fenômeno] segue em elevação. O Brasil precisava aprender a enfrentar isso porque isso coloca em risco a própria democracia”, comenta a coordenadora do Programa de Proteção de Defensoras/es de Direitos Humanos e da Democracia da ONG Justiça Global, Sandra Roble.
Gênero
A técnico labareda atenção ainda para um sabido recorte relacionado à dinâmica da violência: as mulheres foram o tramontana de 46% dos ataques registrados pela pesquisa entre novembro de 2022 e agosto deste ano. Nesse caso, as principais ocorrências foram de ameaças, responsáveis por 73 registros, e ofensas, estas com 34 episódios. Sandra Roble destaca ainda outras nuances dos números.
“As mulheres, mulheres negras e trans, estão menos representadas nos espaços de poder na política. A gente tem uma representação de homens brancos muito maior, mas labareda a atenção uma vez que elas estão sendo mais atacadas neste cenário [contemporâneo]. No período analisado, a gente identificou 15 casos de ameaças de estupro a mulheres parlamentares, por exemplo. A gente vê que também tem as especificidades de que, quando [a vítima] se trata de uma mulher, a questão da prenúncio de violência sexual é um instrumento [comum], e a gente não identificou nenhum caso desses contra homens, por exemplo.”
A pesquisa
O estudo, intitulado “Violência Política e Eleitoral no Brasil”, está em sua terceira edição e ainda terá outras partes divulgadas adiante, em seguida o primeiro vez do pleito deste ano. Com relação ao material de estudo, os organizadores do levantamento consideraram, para a coleta de dados, um conjunto de materiais pescados a partir de procura ativa de notícias em veículos jornalísticos, redes sociais, buscadores de internet e ainda de rastreamento automatizado de notícias em código Python, um tipo de linguagem de programação. Foram consideradas somente ocorrências nas quais havia indícios de motivação política.
“A gente ampliou, ao longo das últimas edições, os nossos mecanismos de buscas, até mesmo as palavras-chave. A partir disso é que a gente reúne os casos mapeados”, explica a coordenadora de Incidência Política da Terreno de Direitos, Gisele Barbieri.
Contenção
Para a técnico, o cenário de violência política exige um espaçoso comprometimento do Estado brasílio e ações articuladas de combate ao problema. “A gente precisa de uma união dos órgãos de Justiça, do Legislativo e até mesmo de um trabalho de conscientização da sociedade. Uma sátira que a gente faz às legislações que existem pra punir a violência política é que elas têm um caráter meramente punitivista: elas encarceram, cobram multas, mas não ensinam aos agressores nem à sociedade o que é esse fenômeno e uma vez que ele vem interferindo na nossa sociedade.”
Gisele Barbieri ressalta que faltam ainda ações capazes de gerar uma cultura de prevenção da violência no campo político. “Por isso é tão importante pensarmos um caráter pedagógico para as nossas legislações. A gente precisa fazer com que esse debate seja de todos na sociedade. Enquanto não tivermos ações coordenadas e voltadas a isso, vai ser difícil superar. É necessário que o Estado assuma esse fenômeno uma vez que instrumento que tem comprometido a democracia brasileira e que por isso precisa ser combatido.”
Edição: Nicolau Soares
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